Jeremy Clarkson, o popular, irreverente e politicamente incorrecto apresentador de programas televisivos sobre automóveis (e não só), tem sobrevivido, mais ou menos incólume, à normalização personalística e política a que assistimos nos meios de comunicação social mainstream.
A estrela do velho Top Gear, uma das mais bem sucedidas plataformas mediáticas na história do entretenimento televisivo, sobreviveu ao facto de ser um incondicional dos motores de combustão interna e um negacionista climático. Sobreviveu ao constante ataque que desde sempre direccionou aos limites de velocidade e aos radares e à praga das bicicletas e das trotinetas, tanto como aos excessos fascistas do estado, à sua tirania tributária e à sua obsessão com a segurança.
Sobreviveu por centenas de vezes a constatações de facto, altamente assertivas, como esta aqui, por exemplo:
This is the kind of rational thinking they want to purge from your mind this year. In a world of clapping seals, be a @JeremyClarkson
Happy new year! 😘pic.twitter.com/Jhl050D3Rk
— Laurence Fox (@LozzaFox) January 1, 2023
O resiliente e irredutível personagem da vida pública inglesa, para não dizer global, não sobreviveu porém a um artigo de opinião que escreveu há umas semanas atrás, no “The Sun”, onde confessa e justifica, em óbvio tom humorístico, um saboroso desdém por Meghan Markle. O artigo foi entretanto censurado, supostamente a pedido do autor, mas o ContraCultura transcreve as linhas mais significativas desses breves, satíricos e lúcidos parágrafos:
At night, I’m unable to sleep as I lie there, grinding my teeth and dreaming of the day when she is made to parade naked through the streets of every town in Britain while the crowds chant, “Shame!” and throw lumps of excrement at her.
(…)
I can tell you, with absolute certainty, what’s coming next.
Harold’s Spare book will be released.
Then she’ll do one called I Think I May Be God. And then she’ll have exhausted the whole royal thing — so will be off.
We will see Diana-style photographs of her, all on her own, outside the Taj Mahal.
And then she will be pictured gazing into the middle distance, on the back of a playboy’s superyacht and will marry a tech billionaire and they’ll have a child called something vomitty like Peace. Or Truth.
Or Love.
Harold, meanwhile, will be stuck in California with no friends, either there or here, no family to support him and an army of young girls who’ll believe Meghan’s story that the marriage break-up was all his fault because he’s, like, you know, sooooo a man.
A Jeremy Clarkson tudo até aqui tinha sido permitido, mas isto é que não. A desertora Duquesa de Sussex não pode ser assim sujeita à maldicência. É um pecado capital. Até porque parece que Meghan Markle é uma mulher. Até porque, contra todas as aparências, é uma mulher negra.
“But she’s a woman, he can’t say that.”
Yeah, some women are great, some women are odiously unlikeable, deal with it. Embrace equality.
— Paul Joseph Watson (@PrisonPlanet) December 18, 2022
O ContraCultura é, por definição, inimigo declarado do movimento woke, da sua pulsão totalitária e da cultura de cancelamento e censura que instituiu sobre o livre discurso. Mas desta vez, há que dizer que Jeremy Clarkson foi apenas vítima de si mesmo. E porquê? Porque cometeu o máximo erro de lesa-dignidade: pediu desculpa. Duas vezes. E claro, não só as suas desculpas não foram aceites como a sua imagem pública foi obliterada no processo, sendo agora um pária no contexto das elites e dos meios de comunicação social britânicos.
Ajoelhou-se, foi cancelado. É bem feito. Porque raio foi pedir desculpa? E pedir desculpa porquê? Por não gostar da insuportável Duquesa de Sussex? Por ter escrito duas ou três verdades, num registo claramente humorístico? Que estupidez. Que fraqueza.
Jeremy devia saber, nesta altura do campeonato, que procurar o perdão junto da turba woke é completamente contraproducente. Essa gente nunca vai gostar dele ou perdoar-lhe seja o que for. E assim perdeu o respeito até daqueles, como este redactor, que admiravam a sua coragem, frontalidade, independência e sentido de humor.
Mas também devemos reflectir sobre o sucedido como um alerta muito preocupante. Porque se até figuras carismáticas e populares, com fortunas que possibilitam total independência, cedem, num constrangedor espectáculo de humilhação pública, à tirania mediática dos poderes instituídos, que remotas hipóteses de permanecer desalinhados temos nós, anónimos e comuns mortais?
No contexto dos ensinamentos de Epicteto, o Contra persiste na firme crença de que essas probabilidades aumentam na directa medida em que nos preocupamos mais com aquilo que controlamos (o nosso carácter, as nossas convicções, o nosso comportamento) e menos com aquilo que não controlamos (a opinião dos outros, por exemplo.)
E se Clarkson tivesse lido os estoicos, se calhar estava agora mais confortável sobre a vida e sobre a ideia que tem de si próprio.
Relacionados
18 Out 24
Bret Baier, da Fox News, afirma que a campanha de Kamala Harris recorreu a expedientes para encurtar a duração da entrevista.
Conscientes do desastre inevitável, os executivos da campanha de Kamala Harris tudo fizeram para reduzir para metade uma entrevista que de qualquer forma não ia durar mais que meia hora. Ainda bem, porque ouvir Kamala durante tanto tempo seria deveras doloroso.
17 Out 24
O pesadelo da imprensa corporativa: JD Vance não brinca em serviço.
O candidato republicano à vice-presidência parece divertir-se deveras enquanto procede, com tranquilidade e presença de espírito, à demolição das falsas premissas da imprensa corporativa. Devemos aprender com ele.
14 Out 24
Porque será? Imprensa corporativa não encontra justificação para o facto de Trump estar a realizar menos comícios.
A Axios publicou um artigo que refere que Donald Trump está a realizar menos comícios e pergunta-se porquê, olvidando, com requintada hipocrisia, o facto óbvio do homem correr risco de vida de cada vez que sai à rua.
11 Out 24
O povo brasileiro pode voltar ao X. Pelas piores razões possíveis.
A partir de agora, qualquer cidadão brasileiro que expresse no X uma opinião dissidente, pode ser violentado pelo estado, com a alegre colaboração da plataforma de Elon Musk. Quem anunciar isto como uma vitória da liberdade de expressão está a fumar uma droga má.
9 Out 24
Washington Post prepara o público para a inversão de uma vitória de Trump com votos por correio.
2024 como 2020: O jornal onde a verdade vai para morrer já está a preparar os seus infelizes leitores para mais uma noite eleitoral corrompida pela fraude, sendo de esperar que Trump lidere a contagem até que, de repente, a altas horas da madrugada...
8 Out 24
De furacões e eleições: entre os factos e as teorias da conspiração.
Os furacões Helena e Milton vão factualmente impactar as eleições presidenciais americanas. Resta saber a quem cabe a responsabilidade pelas duas dantescas tempestades: à Mãe Natureza ou ao Tio Sam.