No universo alternativo em que vive a rapaziada da redacção do Observador, os russos estão a perder a guerra desde que a começaram. E sem munições desde 1945. E sem armas desde que se enfiaram no Afeganistão. Enquanto o Kremlin comanda um exército de amadores que usam pás, pedras e paus com surpreendente eficácia, considerando o número de soldados ucranianos que entretanto mataram à traulitada, Vladimir Putin já morreu de cancro três vezes.
Em direto/ Russos estão a esgotar munições de artilharia e combatem com “pistolas e pás”, diz Defesa britânica https://t.co/RKsk3CSrrm
— Observador (@observadorpt) March 5, 2023
Neste mundo sobrenatural, habitat de toda a ficção a que hoje ainda há quem chame jornalismo, Zelensky estará confortavelmente instalado no Kremlin já no próximo Verão, senhor de todas as estepes a leste do Bairro Alto, depois de uma guerra termo-nuclear ter extinto, sem impactos ambientais nem erros de precisão, apenas os efectivos das forças armadas russas, os quadros do aparelho burocrático de Moscovo e um ou outro degenerado que tenha dúvidas sobre as virtudes da democracia ucraniana, a urgência existencial levantada pelas alterações climáticas ou a verdade científica das identidades de género.
É natural que gente que nunca leu um livro de História na vida, ou um romance de Tolstoi, se sinta bem a escrever novelas de ficção científica. O desamor dos factos, as incoerências de visão e de filosofia, os delírios ideológicos e os excessos da imaginação, próprios deste género literário quando levado ao baixo critério do cordel, constituem um apelo incontornável para apparatchiks ignorantes e activistas em desespero de causa.
Apesar de constantemente reportarem que os bombardeamentos sobre a Ucrânia matam inocentes com fartura, os escribas tontos deste blog glorificado informam concomitantemente a sua audiência que a artilharia russa não tem bombas. No Contra, não fazemos ideia sobre o género de cogumelos que são consumidos pelos millenials vegetarianos que lá trabalham, mas não é de excluir a hipótese da alucinação colectiva.
É assim aconselhável escaparmos rapidamente à twilight zone do Observador, e seguirmos, por exemplo, Bruno de Carvalho, um jornalista independente português que está lá, onde a guerra se trava. Para ficamos não só um bocadinho mais conscientes da realidade factual, como percebemos o ponto de degradação ética e psíquica a que chegou a imprensa mainstream.
Dentro da central nuclear de Energodar, a maior da Europa. Produzia mais de um quinto de toda a electricidade gerada na Ucrânia e metade de toda a energia produzida no país. Está sob controlo das autoridades e forças russas. pic.twitter.com/cicBzcuZLQ
— Bruno Carvalho (@bcarloscarvalho) March 7, 2023
Ninguém pode em boa verdade dar como ganha esta guerra, seja para que lado for. Há até a trágica hipótese de acabarmos por mergulhar num conflito global, sem vencedores. Mas pensar – e noticiar – que a Rússia combate na Ucrânia uma guerra improvisada, sem orientação estratégica nem apoio logístico e tecnológico, ou que as suas forças militares estão deficientemente armadas ao ponto de combaterem com “pistolas e pás” é, tão só, papaguear propaganda. Muito má propaganda, ainda por cima.
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