O chefe da defesa norueguesa tornou-se a mais recente figura militar de topo a avisar que a Europa tem uma questão de anos para se preparar para a guerra contra a Rússia.

Eirik Kristoffersen afirmou que os países da NATO têm “dois, talvez três anos” para se prepararem para um imaginário ataque das forças de Vladimir Putin.

Na semana passada, os líderes da defesa da NATO reuniram-se em Bruxelas, onde vários sublinharam a importância de os países da Europa aumentarem a sua prontidão para um ataque. Isto aconteceu depois de os principais dirigentes da segurança sueca, o Ministro da Defesa e o Comandante Supremo das Forças Armadas, afirmarem que o país poderá em breve enfrentar uma guerra com a Rússia e de terem sido divulgados planos secretos que revelam que a Alemanha está a preparar-se para que as forças de Putin ataquem a NATO já em 2025.

Em declarações à NTB, a agência noticiosa norueguesa, Kristoffersen sublinhou que Moscovo aumentou as suas reservas militares muito mais rapidamente do que o previsto. É o primeiro dos profetas da guerra a avançar com um argumento para o alarmismo. Este argumento, porém, não resiste a cinco minutos de reflexão. É claro que a Rússia, que está em guerra directa com a Ucrânia e por procuração com o Ocidente, “aumentou as suas reservas militares”. É óbvio também que os poderes instituídos na Europa e nos EUA foram surpreendidos pela capacidade de mobilização e pela resposta industrial dos russos, que reagiram “mais rapidamente que o previsto”. Mas isso não constitui evidência material de que Putin esteja a planear atacar a NATO ou fazer a guerra na Europa.

A Noruega partilha uma curta fronteira com a Rússia, a norte da Finlândia, no ponto mais setentrional da Europa, e é, por isso, estrategicamente importante para a NATO, de que é um dos estados fundadores.

Nas suas declarações à NTB Kristoffersen, que se auto-define como um líder militar “impaciente e inclusivo” (o que faz levantar as sobrancelhas a qualquer pessoa sensata), reforçou o seu especulativo raciocínio:

“A Rússia aumentou significativamente a produção. Colaborou também com países como o Irão e a Coreia do Norte, o que significa que podemos ter um reforço mais rápido da defesa russa do que o previsto no ano passado. Por isso, temos de aproveitar bem o tempo para reforçar a nossa própria defesa”.

A influência da Coreia do Norte num “reforço mais rápido da defesa russa” é um produto da mente delirante do general norueguês e uma análise minimamente lúcida concluirá rapidamente que a Rússia foi empurrada pelo Ocidente para uma situação sem alternativas para além de reforçar as suas alianças com velhos aliados regionais, como o Irão, e inventar novas parcerias para resistir às sanções e ao isolamento económico a que foi submetida por Washington e Bruxelas, como é o caso do recente entendimento multilateral com a China, e da intensificação das relações internacionais no contexto do BRICS.

Na verdade, se há um comportamento provocatório na direcção da guerra é aquele interpretado pela Europa e pelos Estados Unidos. Profundamente envolvidos com o regime Zelensky, ao ponto de colocarem operacionais na frente de combate, financiando desmedidamente o esforço de guerra ucraniano e fornecendo-lhe todo o tipo de armamentos, colaborando activamente na destruição de estruturas não militares russas, como pontes e gasodutos, expandindo constantemente a influência da NATO para países que fazem fronteira com a Rússia, castigando Moscovo com uma parafernália de sanções e restrições à actividade económica, diabolizando o Kremlin ao ponto de compararem Putin com Hitler, assumindo claramente que desejam uma mudança de regime em Moscovo, os aliados ocidentais têm vindo, nas últimas décadas, a esticar a corda de forma completamente ensandecida e temos que dar graças a Deus pela paciência, a cautela e o bom senso de Vladimir Putin.

Que, há que dizê-lo, não é nenhum santo. A continuarmos a insistir neste trajecto beligerante, haverá por certo um momento em que a corda pode rebentar. Aliás, já eclodiram guerras na virulenta história da humanidade por muito menos do que isto.

O próprio raciocínio alarmista de Kristoffersen pode funcionar ao contrário e levar os russos a considerarem a mobilização para uma guerra na Europa. A Alemanha, por exemplo, aumentou drasticamente as suas despesas com a defesa, enquanto a Finlândia aderiu rapidamente à NATO. A Suécia deverá seguir-se-lhe assim que a sua candidatura for aprovada. Perante este cenário de hostilidade cerrada do Ocidente, é apenas natural que Putin reforce as suas forças armadas.

Mais a mais, Kristoffersen reconheceu, submetendo a sua lógica a um incrível exercício de contorcionismo, que boa parte dos recursos bélicos europeus estão a ser sacrificados na Ucrânia e que esse esforço é vital para a NATO porque actualmente Kiev é a “primeira linha de defesa da Europa”, sendo que esse envolvimento será continuado “durante o tempo que for necessário”.

“Trata-se de um risco calculado. Se o perigo de um ataque da Noruega fosse iminente neste momento, não poderíamos ter dado tantas armas. Mas não é esse o caso”.

Não é esse o caso? Então não temos só “dois ou três anos” para que a Rússia entre pela Europa a dentro? “Dois ou três anos” não constituem uma ameaça iminente no calendário do General? E acredita o líder militar “impaciente e inclusivo” que o Ocidente vai conseguir renovar os stocks das armas que o regime Zelensky está a desbaratar nesse curto prazo?

É fácil concluir que Eirik Kristoffersen não passa de um farsante.

Não deixa porém de ser curioso que, durante cerca de cinquenta anos de guerra fria, quando o Ocidente defrontava um regime fundamentado numa ditadura feroz, realmente draconiano e ameaçador, ninguém alguma vez na NATO, na Comunidade Europeia ou no Pentágono se mostrou assim agressivo, assim alarmista face à possibilidade – ou inevitabilidade – de uma guerra aberta e total com a União Soviética, no coração da Europa.

Putin é mais ameaçador que Estaline, Krutschev e Brezhnev juntos.

É espantoso.