A prova provada que a lógica corporativa do Estado Português pouco mudou entre a Segunda e a Terceira repúblicas está estampada no caso dos Certificados de Aforro.
Com os bancos, sem excepção, a recusarem reflectir o aumento das taxas de juro nos produtos de poupança que oferecem aos seus clientes, apesar de os castigarem, até ao último cêntimo, nos produtos de crédito, os Certificados de Aforro têm sido a única opção dos portugueses para fazerem face à inflação, já que a remuneração destes títulos tem de facto acompanhado as tendências do mercado e foi em Abril de 3,5%.
Até o infeliz ministro das finanças, Fernando Medina, reconheceu que a consequente corrida aos Certificados de Aforro
“decorre da livre escolha que os portugueses têm feito por não encontrarem no mercado uma oferta do ponto de vista da poupança, que seja compatível com uma remuneração adequada.”
Este reconhecimento não impediu porém o governo de ceder às pressões do todo poderoso sector bancário. A insaciável ganância dos accionistas da banca privada não só impede justas retribuições nas linhas de poupança das entidades de que são investidores como se recusa a aceitar as mais elementares regras do mercado de capitais. E se os bancos querem manter, em uníssono e contra todo e qualquer princípio ético que possa sobreviver à imoralidade dos mercados financeiros contemporâneos, as taxas de juro baixas nos produtos de poupança, nem o Estado parece ter poder para oferecer uma alternativa: o governo poderá avançar para alterações na taxa de rentabilidade de futuras subscrições dos Certificados de Aforro, ou emitir novas séries com outras condições e remuneração mais baixa.
Para além da óbvia batota – o Estado não deve alterar as regras a meio do jogo quando as condições deixam de ser favoráveis para o emissor – a cartelização dos interesses entre as elites políticas e financeiras em continuado desfavor das massas está à vista de toda a gente.
Dado o desavergonhado conluio entre os sectores públicos e privados, os portugueses são assim condenados a pagar altas taxas de juro em crédito, mas a não beneficiar dessa conjuntura em aforro, num contexto que é, ainda por cima, inflaccionário e, o que é mais, recessivo.
Ao baixar a rentabilidade dos Certificados de Aforro, o Estado Português, com o explícito intuito de garantir altos dividendos aos accionistas da banca privada, prefere aumentar a dívida soberana, pedindo dinheiro emprestado a instituições financeiras internacionais e fundos de grandes investidores, em vez de recolher o investimento dos seus próprios cidadãos, para benefício de ambos.
A filosofia política do ContraCultura é libertária e não tem por isso qualquer simpatia por regimes ditatoriais, mas uma coisa tem que ser dita: Nem o Estado Corporativo de Salazar foi draconiano como draconiana é esta actual República, espécie de sindicato criminoso em que os dirigentes políticos colaboram activamente com o grande capital e os interesses instalados para empobrecer os cidadãos de todas as maneiras possíveis, seja através de cargas fiscais absolutamente destruidoras de qualquer hipótese de florescimento da classe média e das pequenas e médias empresas, seja pela transferência de privilégios e riqueza para aqueles parasitas que monopolizam o poder económico do país.
Não é nada que não aconteça por todo o Ocidente, claro. Mas é sempre doloroso ver como Portugal está hoje perfeitamente enquadrado nas lógicas e nas narrativas e na praxis das elites globalistas sediadas em Wall Street, Davos, Bruxelas e etc.
Um país que historicamente sempre se atrasou em relação aos progressos civilizacionais, teima em chegar cedo aos seus retrocessos.
Triste sina.
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