“Se a inflação não for eliminada rapidamente, os avanços tecnológicos e científicos não impedirão uma tremenda catástrofe financeira que destruirá praticamente toda a civilização criada nos últimos cem anos.”
Ludwig von Mises . On Money and Inflation
O filósofo George Santayana declarou que “aqueles que não se lembram do passado estão condenados a repeti-lo”, e nos tempos que correm estamos precisamente a repetir um enorme erro económico que trouxe a ruína a inúmeras sociedades do passado. Os bancos centrais estão a imprimir dinheiro a um ritmo insano que pode provocar o colapso da economia e, com ele, a queda da civilização. Neste artigo, utilizando o exemplo do Império Romano, vamos explorar os efeitos destrutivos de uma política de inflação.
“Não importa quão modesta ou benigna possa parecer no início, uma política inflacionista é sempre fatal a longo prazo. Tem sido tentada muitas vezes e sempre falhou. Não resolve os problemas da sociedade; agrava-os e conduz inexoravelmente à autodestruição.”
William Ophuls . Immoderate Greatness
A inflação é definida de várias maneiras. Alguns utilizam-na para referir um aumento do nível geral dos preços, outros utilizam-na para referir um aumento da oferta de dinheiro emitido por um governo ou um banco central. Para os efeitos deste texto, vamos concentrar-nos neste último fenómeno, uma vez que a inflação monetária conduz à inflação de preços e, portanto, pode ser considerado como fenómeno primário. Ou como explica o economista Ludwig von Mises:
“Os preços estão a subir porque há uma quantidade adicional de dinheiro, procurando uma quantidade não aumentada de mercadorias. E os jornais ou os teóricos chamam aos preços mais altos, “inflação”. Mas a inflação não está na alta dos preços; a inflação está no novo dinheiro que é bombeado para o mercado. É este excesso de moeda que depois inflaciona os preços”.
Ludwig von Mises . On Money and Inflation
No início da República de Roma, o Estado empenhou-se numa política de expansão territorial e, a cada conquista de uma região vizinha, saqueava as riquezas das tribos e nações derrotadas e aumentava o seu tesouro. No entanto, após sofrer a derrota contra as tribos germânicas em 9 d.C., o Imperador Augusto pôs fim à política de expansão e cessou o fluxo de riqueza provinda de terras estrangeiras. Augusto, e os imperadores que se lhe seguiram, enfrentaram assim um crónico problema deficitário. E os impostos não podiam ser aumentados sem agitação social.
Para combater este problema, Nero iniciou em 64 d.C. uma política que os imperadores posteriores consideraram irresistível. Esta política implicava a degradação do valor da moeda padrão de prata romana, o denário, através da sua infusão com metais baratos como o cobre, e o “recorte” tanto de moedas de ouro como de prata, ou por outras palavras, a redução do seu tamanho. O excesso de metal precioso obtido a partir do corte e desvalorização da moeda foi então utilizado para criar mais moeda, e com estas moedas recentemente cunhadas o Estado romano cobriu as suas dívidas e despesas e engordou os bolsos dos estadistas, dos políticos e dos burocratas.
Os equivalentes modernos desta política são a emissão de papel sem valor nominal e o dinheiro digital. No entanto, retirar prata à composição da moeda, reduzir o seu tamanho, imprimir mais papel sem correspondência com reservas em ouro ou acrescentar dígitos a uma conta de um banco central são expedientes que apresentam exactamente o mesmo resultado: inflação monetária. A quantidade de dinheiro é aumentada, mas o seu valor intrínseco diminui, o que leva à inflação dos preços e a um aumento do custo de vida.
Durante um período de inflação monetária, o dinheiro recém-criado não entra na economia de maneira uniforme. Tende a chegar primeiro às mãos dos que são politicamente bem relacionados. Como estas pessoas e instituições são capazes de gastar o dinheiro recém-criado antes que a inflação monetária faça subir os preços, beneficiam do processo. Ou como Jesus Huerta de Soto escreve:
“O processo [de inflação monetária] dá origem a uma redistribuição de rendimentos em favor daqueles que receberam pela primeira vez as novas injecções ou doses de unidades monetárias, em detrimento do resto da sociedade, que descobre que com o mesmo rendimento monetário já não tem o mesmo poder de compra, porque o preço de bens e serviços começou a subir.”
Jesus Huerta de Soto . Dinheiro, Crédito Bancário e Ciclos Económicos
Na Roma antiga, o Estado aproveitava o atraso entre a desvalorização do denário e a realização pelo mercado do seu valor diminuído. Pagava as suas dívidas e despesas com moedas recentemente cunhadas, a preços que não reflectiam o aumento da oferta de dinheiro. Desta forma, a elite política de Roma descobriu um meio de aumentar as suas despesas, sempre que quisesse, sem aumentar os impostos. E assim, seguindo o exemplo dado por Nero, sempre que um imperador enfrentava uma escassez de fundos, procurava expandir a capacidade militar, instituir um novo projecto ou programa, ou simplesmente aumentar a tesouraria do Estado, desvalorizava e reduzia fisicamente a moeda e aumentava a oferta de dinheiro. Como escreve von Mises:
“Se quiser estudar a inflação hoje, vá a um museu onde têm moedas cunhadas no passado e veja o que aconteceu às moedas de prata do antigo Império Romano… Verá o que os governos fizeram para lucrar com a falsificação do sistema monetário, aumentando ilegalmente e contra a vontade do povo, a quantidade de dinheiro”.
Ludwig von Mises . On Money and Inflation
No ano 200 d.C., o denário estava degradado a 50% do seu conteúdo original de prata, e o aumento dos preços que se seguiu tornou-se impossível de ignorar. Nessa altura o império romano estava em constante movimento na direcção da falência. E assim, apesar da subida dos preços, o Estado decidiu tentar manter a ilusão de prosperidade, continuando com a sua política Inflaccionária. Como resultado, a moeda tornou-se inútil. O império começou a recorrer mais e mais ao trabalho escravo e a cobrar impostos sob a forma de bens directamente utilizáveis pelos militares e outros ramos do governo, ou em ouro para evitar ter de aceitar as suas próprias moedas sem valor.
Referindo-se ao que acontece a uma sociedade quando o seu sistema monetário é progressivamente destruído pela inflação, o historiador americano Otto Friedrich advertiu:
“Se o dinheiro se torna inútil, então também inútil é o governo.”
Otto Friedrich . Antes do Dilúvio
Esta ruptura na ordem social era facilmente visível na Roma Antiga. Durante o período entre 235 e 284 d.C., grupos de desertores militares, que o Estado romano não podia pagar, vagueavam pelo campo, pilhando pequenas cidades e quintas. Bárbaros saquearam e queimaram cidades, destruíram colheitas, roubaram gado, e levaram os romanos à escravatura. A duração média do reinado de um Imperador era de alguns meses, muitos imperadores romanos foram executados e, a certa altura, 30 homens diferentes reivindicaram o trono. As guerras civis eram comuns. A população diminuiu. A ilegalidade prevalecia nos territórios que permaneciam sob controlo romano.
“Da barbárie à civilização é preciso um século; da civilização à barbárie, não mais que um dia”.
Will Durant . The Reformation: The Story of Civilization
Na tentativa de lidar com o rápido aumento dos preços, em 301 D.C. o Imperador Diocleciano cometeu o erro que tantos políticos cometem durante um período inflacionário. Recusando-se a reconhecer que a carestia era impulsionada principalmente pela política de inflação monetária do Estado, tentou resolver o problema implementando o controlo de preços para bens como o trigo e outros produtos essenciais. No entanto, esse controlo de preços levou, como sempre leva, à redução drástica da oferta, à escassez, à ruína dos comerciantes e à dizimação do comércio entre as várias regiões de Roma. “A pura necessidade levou à revogação da lei”, explicou Lactantius, um conselheiro do Imperador Constantino. A certa altura, Diocleciano considerou restaurar o valor da cunhagem, mas o Estado não tinha reservas suficientes de prata e ouro. Diocleciano, e os imperadores que o seguiram, tinham as suas mãos atadas e era tarde demais para salvar a economia do império.
“Tal como quando se começa a usar certas drogas não se sabe quando nem como parar, o mesmo acontece com a inflação: os governos não sabem travá-la.”
Ludwig von Mises . On Money and Inflation
Devido às prolongadas políticas inflácionárias do Estado, na primeira metade do século IV reinou a hiper-inflação. A medida de trigo, em tempos normais, seria vendida por meio denário… A mesma medida seria vendida em 335 d.C. por mais de 600 denários e em 338 por mais de 10.000. Em 324 o Solidus (moeda de ouro) valia 4.250 denários, mas em 337 valia 250.000. Em 363 o valor era de 30.000.000 denários. Quaisquer que fossem as poupanças que os plebeus tinham em denários, foram reduzidas a um valor próximo do zero. Aqueles que não podiam pagar os seus impostos foram presos, e assim algumas famílias abandonaram as suas casas e posses ou venderam os seus filhos à escravatura.
“Ao falarmos de inflação, não devemos esquecer que há o perigo de que privar as massas das suas poupanças as torne desesperadas.”
Ludwig von Mises . On Money and Inflation
Os agricultores tornaram-se dependentes da sua próxima colheita. Quaisquer que fossem as colheitas produzidas, eram imediatamente vendidas para cobrir o custo dos impostos. Se os bárbaros atacassem, ou se uma seca ou praga destruísse as suas colheitas, eles pediam emprestado aos vizinhos, passavam fome, ou eram presos pelo Estado.
Devido à crescente ilegalidade, agitação e revolta, a elite política sentiu o seu poder a fugir e, por isso, ficou desesperada. Apesar da pobreza e da fome generalizadas, o Estado tornou-se mais autoritário e continuou a aumentar os impostos e a inflacionar a moeda. No entanto, no século V, os camponeses tinham sido demasiado espoliados pelo Estado, e assim as vantagens oferecidas pelo império declinaram rapidamente, de tal forma que muitos camponeses ficaram apáticos com a dissolução do domínio romano, enquanto alguns se juntaram activamente aos invasores. O império perdeu tanto a sua legitimidade como a sua capacidade de sobrevivência. O sistema já não podia suportar o problema da sua própria existência.
A história de Roma contém muitas vezes lições negligenciadas, mas importantes. Uma destas lições é que quando um governo, ou uma elite financeira, reivindica o direito de expandir a oferta de dinheiro sem limites, brinca com um fogo que pode rapidamente escapar ao controlo e conduzir à ruína económica, à revolução, ou mesmo ao puro e simples colapso da sociedade.
A única forma de protecção contra os perigos de uma política de inflação monetária é que o controlo do dinheiro seja retirado das mãos dos governos e bancos centrais. As interacções entre as pessoas e os agentes económicos, realizadas voluntariamente nos mercados, geram formas de dinheiro que são amplamente utilizadas, e que não podem ser manipuladas por qualquer homem ou instituição. Como Mises escreveu:
“Através de uma longa evolução, os governos têm promovido a ideia de que o dinheiro não é simplesmente um fenómeno de mercado, mas que é apenas aquilo a que chama dinheiro. Mas o dinheiro não é o que o governo diz… O dinheiro é o meio de troca geralmente aceite e geralmente utilizado; não é algo criado pelo Estado; é algo criado pelas pessoas que compram e vendem no mercado.”
Ludwig von Mises . On Money and Inflation
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