Nos últimos dois anos, o Blogville tem publicado uma minimal rubrica que pretende ilustrar com clips da imprensa, videos, imagens fotográficas e publicações de rede social o estado demente a que chegou a civilização, sob o título “Índice da saúde psicossocial do Ocidente: menos que zero.” Na semana passada, a rubrica somou 100 posts. O Contra marca o número redondo com uma revisitação, dividida em duas partes, de alguns desses posts, agrupados tematicamente.

Advertência: alguns dos conteúdos podem ferir a sensibilidade dos leitores.

 

Condicionamento, censura e repressão policial, porque a palavra é a Kalashnikov do século XXI.

É curioso verificar que quanto mais sensíveis as sociedades ocidentais são às palavras, que alegadamente provocam males inomináveis, maior é a violência que os ofendidos e os susceptíveis estão preparados para exercer sobre aqueles que têm a ousadia de dizer aquilo que pensam. Por exemplo, a Universidade americana de Standford deu-se ao orwelliano trabalho de edificar um “Guia Contra a Linguagem Maliciosa”, que chega ao ponto de considerar que a palavra “americano” é de alguma maneira prejudicial à paz social.

 

 

Mas os liceus canadianos parecem não ter qualquer problema em que os seus alunos sejam presos apenas por dizerem que só existem dois géneros.

 

 

Portanto: as palavras são de uma violência incrível. Mas a repressão policial sobre o discurso de menores de idade, não. É até louvável. Edificante. Um acto de paz.

Outro exemplo: um cidadão britânico publica um meme numa conta de rede social. Alguém telefona para a polícia afirmando que esse meme lhe feriu gravemente a sensibilidade. Que lhe criou ansiedade, até. Acto contínuo, o cidadão recebe uma visita da polícia do pensamento e é preso. A violência do meme é muito maior que a violência da polícia do pensamento. E o castigo é proporcional ao crime hediondo da sátira.

 


 

Apoiados por um sistema que opera completamente como uma bem oleada tirania, os políticos da esfera ocidental estão à vontade para criminalizar qualquer desvio aos dogmas instituídos, por mais draconianos e intrusivos que sejam. Nos Estados Unidos, uma legisladora da Virgínia quer prender os pais que não tratem os filhos pelo pronome certo. E tudo o que é preciso é que um adolescente intratável com uma qualquer crise de identidade faça a denúncia dos progenitores para que estes sejam imediatamente culpados e adequadamente castigados.

 

 

Não admira portanto que a vocação autoritária e censória, que é latente sempre que o homem se organiza institucionalmente, esteja neste momento em galope de rédea livre. E como um censor é sempre alguém que não tem noção do ridículo, acontecem fenómenos espantosos a torto e a direito. Em Londres, a galeria de arte que guarda o célebre, belíssimo e enigmático “Casal Arnolfini”, de Jan van Eyick, decidiu retirar a obra das suas paredes porque… Um dos personagens é parecido com Vladimir Putin.

 

 

O facto do quadro ter sido pintado cinco séculos e meio antes do actual inquilino do Kremlin ter nascido é irrelevante. Neste mundo ao contrário, o bom senso é descartável, tanto como os princípios éticos mais elementares. O que interessa sobretudo é condicionar as massas à narrativa. Mesmo que isso implique desactivar partes do cérebro humano com magnetos: se essa actividade “científica” transformar crentes em ateus e eliminar qualquer dúvida sobre as virtudes da “diversidade”, será sempre virtuosa.

 

 

Até porque só com gigantescas operações de condicionamento neurológico sobre as massas é que as elites conseguem resultados como aqueles que uma sondagem do Sunday Times revela, e através da qual ficamos a saber que uma significativa fatia da população britânica “gostou” ou “gostou muito” dos confinamentos a que foi submetida. É curioso verificar que a faixa etária onde essa opinião é menos significativa é aquela para a qual o Covid-19 apresentava maiores riscos. E é deprimente verificar o inverso: foram os jovens, cuja probabilidade de falecimento por gripe chinesa é muito próxima do zero, que se mostraram mais felizes por serem encarcerados nos seus respectivos casulos. 28% deles gostaram ou gostaram imenso de serem confinados.

 

 

O teu cão é racista, sexista e está a destruir o planeta.

É difícil acreditar que alguém seja tão estúpido ao ponto de escrever um texto em que acusa os cães de serem racistas, mas o artigo existe mesmo. Houve um imbecil que o escreveu, um editor que o aprovou, milhares de parvalhões que já o leram ou que o vão ler. É este o nosso mundo. É este o inferno delirante que deixámos acontecer.

 

 

Cães e porquinhos da índia, gatos e papagaios, coelhos e cágados: qualquer pessoa que tenha um animal de estimação será condenada pelos grandes articulistas da imprensa corporativa, que são pessoas de moralidade imaculada, ao contrário daqueles que estão a conduzir o planeta ao apocalipse por albergarem dois canários e três peixinhos dourados.

 

 

A solução WEF é exterminá-los a todos porque essa seria uma óptima solução para o épico combate às alterações climáticas, claro. Nada como matar animais em massa para salvar o planeta e para grandes males, grandes remédios. Até porque animais de estimação como os canídeos podem ser interpretados como os melhores amigos do homem e Klaus Schwab não quer que o homem tenha amigos. Klaus Schwab é o único amigo que um homem pode ter: o Grande Irmão. Além disso, os cães são sexistas porque sendo os melhores amigos do homem, estão a discriminar contra as mulheres.

 

 

A cristandade em queda livre.

E se em todas as facetas da vida pública o descalabro civilizacional bate recordes históricos, as igrejas cristãs não podiam ficar imunes. Até porque, para surpresa de quem leu os evangelhos e nunca reparou neste detalhe fundamental, Jesus Cristo podia muito bem ser trans-género… Ou assim acredita o tresloucado reitor de uma universidade com uma forte ligação histórica ao cristianismo, como a Trinity College.

 

 

Não é de espantar, porque são os próprios clérigos das igrejas cristãs que forçam o tema: para além do seu filho não ter um género definido, o próprio Deus do Antigo Testamento gosta de ser tratado, aparentemente, por pronomes que decorrem da propaganda do movimento LGBT do século XXI.

 

 

E daqui para espectáculos protagonizados por drag queens nas igrejas, em substituição dos serviços religiosos, é um pequeno passo. Porque a “diversidade” é um valor sacrossanto. Uma religião que transcende a religião. Um sacramento para além dos sacramentos.

 

 

Ao centésimo post, o Expresso como soft porn.

A rúbrica do Blogville em questão atingiu a centúria com este manifesto feminista recentemente publicado no semanário Expresso, que é hoje talvez o mais infecto exemplar da imprensa corporativa portuguesa.

 

 

Haveria certamente muito que dizer sobre o índice de saúde psíquica da Clara Não, que parece convencida da dignidade do assunto que escolheu para articular, mas não são necessários acrescidos comentários a este atentado à estética e à ética.

Deixamos cair o pano, por agora. Daqui a um ano ou dois, voltaremos a esta rubrica, quando o post duzentos for publicado. A este ritmo vertiginoso de decaimento civilizacional, esses conteúdos serão por certo ainda mais insanos, ainda mais chocantes, ainda mais alienados da razão e da virtude e da decência do que estes agora revisitados.

Desgraçadamente.