Numa inversão de estratégia espantosa, o Pentágono não descartará mais o uso de armas nucleares contra inimigos sem essa mesma capacidade.

De acordo com a Bloomberg, a nova Estratégia de Defesa do Pentágono rejeita os limites éticos à utilização de armas nucleares, advogados pelos defensores do controlo de armamento e até por Joe Biden, na campanha para as presidenciais de 2020, justificando a alteração de filosofia com as ameaças crescentes da Rússia e da China.

Lê-se no documento do Departamento de Defesa publicado na quinta-feira passada:

“Em 2030, os Estados Unidos irão, pela primeira vez na sua história, enfrentar duas grandes potências nucleares como concorrentes estratégicos e potenciais adversários.”

Neste contexto, haverá que “manter uma fasquia muito alta para o emprego nuclear” sem excluir a utilização de armas de destruição maciça em retaliação a uma ameaça estratégica não nuclear aos EUA, às forças norte-americanas no estrangeiro ou aos aliados.

Em mais uma aparatosa inversão de marcha, o senil inquilino da Casa Branca, que se comprometeu a utilizar o arsenal nuclear dos EUA apenas para dissuadir ou retaliar um ataque do mesmo calibre, é agora signatário desta nova e agressiva estratégia, na medida em que “o ambiente de ameaça mudou drasticamente desde então”.

O relatório, que faz parte de um amplo programa de defesa, adianta que a administração Biden reviu a sua política nuclear e concluiu que as políticas de No First Use e Sole Purpose “resultariam num nível de risco inaceitável à luz das capacidades não nucleares que estão a ser desenvolvidas por nações rivais e que poderiam infligir danos a nível estratégico” aos EUA e aos seus aliados.

É claro que esta posição dos norte-americanos não é inédita na história da federação, até porque:

 

 

O documento de estratégia nuclear não explica claramente que ameaças não nucleares poderiam produzir uma resposta nuclear americana, mas é legítimo supor que entre elas se encontrem os misseis hiper-sónicos dos russos e dos chineses, para as quais os EUA ainda não têm uma defesa comprovada.

Em termos ainda mais agressivos, o relatório projecta o que aconteceria a outra potência nuclear, a Coreia do Norte, se lançasse um ataque nuclear contra os EUA, a Coreia do Sul ou o Japão. Essa acção “resultará no fim desse regime”, diz o comunicado.

Assim, as brilhantes mentes neocon responsáveis por este relatório concluíram que é melhor instilar o medo de uma retaliação desproporcionada, tornando assim muito mais provável um ataque nuclear de larga escala por parte do inimigo.

No documento, que foi elaborado muito antes da invasão da Ucrânia, o Pentágono afirma que a Rússia continua a “brandir as suas armas nucleares em nome de uma política de segurança revisionista”, enquanto se espera que o seu arsenal aumente ainda mais. Por outras palavras, o Pentágono sabia o que Putin faria antes de o fazer e isso definiu a revisão dramática do seu posicionamento estratégico. Quase como se o Pentágono tivesse dirigido toda a sequência de acontecimentos.

Entretanto, a China continua a ser o “adversário mais consequente dos EUA nas próximas décadas”, confessou o Secretário da Defesa Lloyd Austin numa carta que apresentava a nova estratégia de defesa. Ele citou as “acções coercivas da China para remodelar a região do Indo-Pacífico e ajustar o sistema internacional às suas tendências autoritárias”, enquanto está a modernizar e expandir rapidamente as suas forças armadas. A China quer ter pelo menos 1.000 ogivas nucleares operacionais até ao final da década, informa o documento, prevendo que podem ser utilizadas para “fins coercivos, incluindo provocações militares contra aliados e parceiros dos EUA na região”.

A estratégia nuclear anuncia programas de renovação do arsenal nuclear americano, incluindo a actualização da tríade nuclear ar-mar-solo, que está a envelhecer. Entre esses novos equipamentos estão o submarino ICBM nuclear da classe Columbia, um sistema  Minuteman III ICBM de base terrestre, o novo Long Range Standoff Weapon e os caças F-35 munidos de armas nucleares para as bases na Europa.

O documento confirmou relatórios anteriores de que o Pentágono irá desactivar a bomba gravitacional B83-1 e cancelar o programa de Mísseis de Cruzeiro lançados no mar, argumentando a favor de uma controversa arma naval da era Trump, a ogiva nuclear de baixo rendimento W76-2, lançada por submarinos, que é descrita como proporcionando “um meio importante para dissuadir um ataque nuclear limitado”.

O relatório estratégico critica os principais programas de armamento dos EUA, que reportam anos de atraso em relação aos prazos estabelecidos e orçamentos excedidos em milhares de milhões de dólares.

“O nosso sistema actual é demasiado lento e demasiado centrado na aquisição de sistemas desadequados para enfrentar os desafios mais críticos que agora enfrentamos. São necessários mais sistemas abertos que possam incorporar rapidamente tecnologia de ponta, reduzindo assim os problemas de obsolescência e diminuindo os custos.”

Os documentos de estratégia do Pentágono foram enviados ao Congresso de forma confidencial em Março, pelo que foram considerados durante a aprovação pelo Congresso do orçamento de defesa de 2023.

Em contraste com a o revisionismo belicoso do regime Biden e do Pentágono, Vladimir Putin, abordando na semana passada a probabilidade de utilização de armas nucleares, disse isto:

“Não há nenhuma razão política ou militar para um ataque nuclear à Ucrânia.”