Como o ContraCultura especulou na semana passada, a incursão militar ucraniana em território russo, a primeira desde 1941, poderá implicar um aumento de agressividade na posição do Kremlin em relação à guerra e ao regime que impera em Kiev.
Os meios de comunicação social estatais russos estão a rever o tom do seu discurso na sequência da invasão ucraniana da região de Kursk, com a colunista da agência noticiosa RIA Novosti, Victoria Nikiforova, a argumentar que um acordo negociado com o Presidente Volodymyr Zelensky está fora de questão e que toda a Ucrânia deve ser ocupada.
Invocando as guerras do século XVII entre o czar da Rússia e a Comunidade Polaco-Lituana, a propagandista do Kremlin escreveu:
“Combatemos nestas terras da Polónia durante décadas, separando-as pouco a pouco, recuando, concluindo armistícios e voltando a avançar de forma constante e inexorável até Kiev se tornar russa.”
Para concluir que
“Não deveria haver ‘Ucrânia’, todo este espaço deveria ser desnazificado, limpo e tornado inofensivo. Sejam quais forem os esforços e os sacrifícios que nos sejam exigidos, estamos prontos para eles.”
A ofensiva da Ucrânia em Kursk “mudou tudo”, segundo Nikiforova, que argumenta:
“As sondagens que mostravam que a população russa era a favor de uma resolução pacífica estão agora desactualizadas.”
Kursk foi o palco de uma das últimas batalhas decisivas entre as forças do Eixo e as forças soviéticas, em 1943. Nikiforova invoca a memória da Segunda Guerra Mundial no seu artigo, chamando a Zelensky “o nazi judeu” e avisando que
“o inimigo está no nosso solo pela primeira vez desde a Grande Guerra Patriótica com veículos de combate da infantaria alemã… a circular na região de Kursk”.
Uma longa guerra.
As forças ucranianas, utilizando tanques britânicos e veículos de combate americanos Bradley e Stryker, entre outros equipamentos da NATO, apoderaram-se de quase tanto território russo nesta ofensiva surpresa como os russos se apoderaram de território ucraniano durante todo o último ano, embaraçando e enfurecendo o Kremlin.
É uma aposta de alto risco para Zelensky, que tem vindo a perder território para os russos desde a falhada contraofensiva de 2023. Em Maio, os russos abriram uma nova frente perto de Carcóvia, a segunda maior cidade da Ucrânia. Uma retirada agora na região de Kursk, após os extensos ganhos iniciais, deixaria os ucranianos numa situação desesperada, com falta de recursos humanos e logísticos em sectores onde as forças russas continuam a avançar.
Referindo-se à maior cidade da Ucrânia ocidental, a que os ucranianos chamam Lviv, e possivelmente à Polónia e a outros membros da NATO a oeste, Nikiforova escreveu:
“Estamos a lutar pela nossa independência e estamos prontos a lutar por ela durante anos e décadas, até chegarmos a Lviv – e, se necessário, ainda mais longe. Com quem é que a Rússia faz fronteira? A Rússia faz fronteira com quem quiser.”
Palavras que deviam preocupar Zelensky. E, na verdade, todos nós, no Ocidente, que estamos a esticar até ao ponto de ruptura a corda da Terceira Guerra Mundial.
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