No dia 12 de Março de 2020, já lá vão quase cinco anos, Jorge Torgal, Professor Catedrático da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, nessa altura membro destacado do Conselho Nacional de Saúde Pública, afirmava em conferência de imprensa realizada em contexto de “início de pandemia” que

“fechar as escolas é ajudar e justificar o medo que não tem razão de ser”.1

O jornal que publicou estas declarações do Professor Catedrático adiantou ainda que um outro órgão de comunicação social confrontara Torgal com afirmações por ele produzidas dias antes, segundo as quais havia “um pânico completamente desproporcional à realidade” e que a Covid-19 “era menos perigosa do que a gripe”2. Questionado sobre se mantinha aquela opinião, Jorge Torgal respondeu:

“Mantenho e ela até se acentua”.3

Nesse mesmo dia o Governo português anunciou a decisão de encerrar todas as escolas e ATL do país, do pré-escolar ao ensino superior, fechando em casa quase dois milhões de crianças e jovens. Cerca de dois meses depois, a 18 de Maio de 2020, apenas os alunos dos 11º e 12º anos do ensino secundário, assim como os estudantes do ensino profissional, retomaram gradualmente algumas actividades lectivas, mas as aulas presenciais foram objecto de restrições securitárias, como a obrigatoriedade do uso de máscara, o “distanciamento social”4, horários ajustados e um conjunto de outras medidas sanitárias cuja racionalidade se filiou quase sempre na necessidade de manter elevados níveis de pânico entre as pessoas e “na melhor evidência científica disponível”6.

Os alunos dos restantes níveis de ensino, como o pré-escolar e o básico (1º ao 9º), apenas regressariam à escola no ano lectivo seguinte, a partir de Setembro de 2020, e sempre condicionados pelas mesmas “medidas de segurança” draconianas, como o uso de máscara nas salas de aula e nos recreios, o insidioso “distanciamento social”, a proibição de partilhar objectos pessoais como as lancheiras, e uma miríade de protocolos securitários, por vezes insanos, impostos pelas autoridades e pelas escolas. Apesar disso, as aulas presenciais viriam a ser novamente proibidas em Janeiro de 2021 e um novo confinamento duraria até 19 de Abril desse ano.

O uso obrigatório de máscara nas escolas foi levantado oficialmente apenas a partir de 21 de Abril de 2022, através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 41-A/2022, publicada a 20 de Abril, que actualizou as medidas de combate à pandemia de Covid-19 após o fim da “situação de alerta”.

De acordo com os dados disponíveis, os alunos do 1º Ciclo (1º ao 4º ano) estiveram em confinamento e sem aulas presenciais durante 155 dias corridos (5 meses e 5 dias), cerca de 110 dias lectivos, distribuídos entre os anos lectivos 2019/2020 e 2020/2021. Os alunos dos 2º (5º e 6º anos) e 3º Ciclos (7º ao 9º ano) estiveram confinados e sem aulas presenciais durante 176 dias corridos (5 meses e 26 dias), 125 dias lectivos, também nos anos lectivos 2019/2020 e 2020/2021. Todos estes jovens estudantes, incluindo as crianças do 1º Ciclo, que tinham à data entre 6 e 10 anos de idade, foram obrigados a usar máscara na escola, a manter “distanciamento social” e a respeitar outras medidas securitárias durante 19 meses e 14 dias, de 14 de Setembro de 2020 a 21 de Abril de 2022.

Estes longos períodos de “distanciamento” – e isolamento – reduziram a interacção das crianças portuguesas com amigos, colegas de escola, familiares e professores, interacção essa que é um factor fundamental no desenvolvimento emocional, social e cognitivo, com especial foco nas idades compreendidas entre os 6 e os 12 anos, altura em que se dá a consolidação de competências fulcrais ao progresso ulterior.

Actualmente, conforme já assinalado noutra publicação6, o Conselho Nacional de Educação afirma que “A escrita é um desafio para mais de metade das crianças do 2.º ano, 56,0%, que revelaram dificuldades ou não conseguiram de todo responder às tarefas”. Estas são as crianças – actualmente com 7 ou 8 anos de idade – que aos 3 anos foram fechadas em casa, separadas do mundo e do convívio com familiares e amigos, obrigadas a ver os pais com a cara tapada por um farrapo, como assombros anónimos saídos de um filme de terror.

Quem tiver presente esse período inicial do ano de 2020 certamente recordará a forma como foi colocada em prática a maior campanha de intimidação e instigação do medo em toda a história da Humanidade. A magia negra dos números, muitos deles falsos, e das imagens, também elas falsas em muitos casos, operou 24 horas por dia, 7 dias por semana, através de todos os meios de comunicação disponíveis, incluindo aqueles que resultaram da conversão de quase todo o aparelho do Estado – e dos seus três poderes – numa verdadeira máquina de propaganda.

Perante tão massiva e coordenada operação – com todas as características de uma missão militar – era impossível impedir que o pavor se instalasse, tendo sido a população a exigir a sua própria clausura, legitimando assim decisões políticas ilegais que se sucederam, todas elas radicando na mais ostensiva ideologia totalitária. Era “por uma boa causa”. Era para “achatar a curva”. Tudo se baseava na mais “consensual evidência científica”.

Cinco anos volvidos, nada está bem, ao contrário do que cinicamente prometeram. Portugal, apesar de um patético e mitológico PRR (Plano de Recuperação e Resiliência – os trinta dinheiros por que traíram a nação), é um país em demolição imparável e crescente – por via demográfica, cultural, política e económica -, ainda que aqueles que todos os dias o desmoronam apontem sempre como causa da catástrofe um malévolo inimigo externo. Trata-se de uma ancestral técnica militar conhecida por “operação de bandeira falsa”, que na História contemporânea encontra a sua primeira forma sofisticada no Incidente de Mukden (1931), quando o Japão encenou um ataque do exército chinês a uma linha férrea para justificar a invasão da Manchúria.

Mas foi assim com Mukden como foi com a Guerra dos Mercenários (Século III a.C.), o Incêndio de Roma (64 d.C.), a Operação Himmler (1939), a Operação Northwoods (1962), a Operação Gladio (décadas de 1950–1980), o Caso Lavon (1954), a Guerra Civil Síria (2011–presente), o 11 de Setembro (2001), a Crise das Dívidas Soberanas (2008), a Pandemia Covid (2020) ou a Guerra da Ucrânia (2022). Só para citar alguns dos mais conhecidos exemplos. Há sempre um inimigo externo a justificar a imposição de um estado de servidão permanente, a justificar a excepção, o controlo e a punição. Por outras palavras, a justificar o fanatismo, a ignorância e a tirania. E foi a perpetuação desse fanatismo, dessa ignorância e dessa tirania, que esteve no centro da decisão tomada em 2020 pelos que ocupam o Estado Português, aos quais coube destruir o futuro de uma geração inteira e, com isso, o futuro do país.

 

 

BRUNO SANTOS
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1 Jorge Torgal: “Fechar as escolas é ajudar e justificar o medo que não tem razão de ser.” – Público . 12.03.2020
2 Idem
3 Ibidem
4 Nunca foi usada a expressão “distanciamento físico”.
5 Grande parte destas “evidências científicas” viriam a revelar-se muito questionáveis.
6 Escola Pública: não diz a bota com a perdigota. Bruno Santos . ContraCultura . 13.02.25