O Presidente russo falou no início desta semana, numa reunião de correspondentes de guerra no Kremlin, sobre a situação na Ucrânia, as suas ambições a longo prazo e se será necessária uma nova mobilização.
Os objectivos da operação militar de Moscovo na Ucrânia não mudaram e estão, de facto, a ser cumpridos pela última ofensiva de Kiev, disse Vladimir Putin. Em Fevereiro de 2022, quando a Rússia lançou a sua campanha militar, Putin citou a necessidade de proteger a população de Donbass, bem como o facto de Kiev não ter implementado os acordos de paz de Minsk de 2014-2015, como razões para a sua acção. Disse ainda que a Rússia procurava a “desmilitarização” e a “desnazificação” da Ucrânia, o que incluía o compromisso de Kiev de manter um estatuto de neutralidade e de abandonar os planos de adesão à NATO.
Putin também abordou a glorificação pela Ucrânia do colaborador nazi Stepan Bandera, os combates em curso na frente sul e as consequências do desastre da barragem de Kakhovka, entre outros assuntos.
Mas os pontos fundamentais da sua alocução resumem-se a estes cinco momentos:
Os objectivos de Moscovo permanecem inalterados.
Os objectivos definidos em Fevereiro de 2022 são “essenciais” para Putin e, embora alguns pormenores estejam sujeitos a alterações com base na evolução da situação, permanecem fundamentalmente os mesmos. A desmilitarização da Ucrânia está a acontecer “de forma gradual e metódica”, com as tropas de Kiev a dependerem agora inteiramente de armas, equipamento e munições ocidentais, incapazes de produzir seja o que for localmente. Houve progressos na protecção da população de Donbass, embora a Ucrânia continue a bombardeá-la. Se os ataques de drones e as incursões de Kiev continuarem, Moscovo poderá considerar a criação de uma “zona tampão” em território ucraniano, para os manter fora de alcance. Putin afirmou claramente que
“Não se verificaram alterações fundamentais em termos dos objectivos que estabelecemos no início da operação.”
Sobre o escasso progresso da ofensiva da Ucrânia.
Kiev lançou uma ofensiva em grande escala a 4 de Junho, utilizando as tropas e o equipamento fornecidos pelo Ocidente, mas sem sucesso em nenhum sector. Segundo o presidente russo, os ucranianos
“estão a sofrer pesadas baixas. Mais do que as nossas e por um factor de dez”.
Em termos de equipamento, a Ucrânia já perdeu cerca de 30% do que o Ocidente forneceu, incluindo três vezes mais tanques do que a Rússia. Estes dados são credíveis para além da mensagem oficial do Kremlin e podem ser facilmente contabilizados online.
Porque é que a Rússia não é como a Ucrânia.
Em resposta a uma pergunta sobre a introdução da lei marcial para lidar com os assassinatos de jornalistas e figuras públicas como Darya Dugina e Vladlen Tatarsky, ou o ataque a Zakhar Prilepin, Putin comentou:
“Somos um governo de leis, eles comportam-se como um regime baseado no terror. A Rússia não pode utilizar métodos terroristas, mas irá intensificar o trabalho dos serviços de segurança para contrariar as conspirações de Kiev”.
O inquilino do Kremlin acrescentou que não será necessário introduzir a lei marcial.
Haverá outra mobilização?
A acreditar no presidente russo só serão necessárias mais tropas se houver uma decisão de marchar sobre Kiev, mas não nas circunstâncias actuais,. Para além dos 300.000 reservistas convocados no Outono passado, mais de 150.000 cidadãos inscreveram-se voluntariamente para o serviço contratual, a um ritmo de 9.500 por semana. Os recrutas que cumprem o seu serviço regular também participaram na batalha de Belgorod, tendo-se saído “admiravelmente bem”.
Sobre o papel da indústria russa no conflito.
O chefe de estado sublinhou que a Rússia começou a remodelar a sua indústria de defesa há oito anos, mas que o conflito tornou claras as deficiências que ainda persistem, como a disponibilidade de drones. Desde o início das hostilidades, a indústria russa aumentou a produção de certos sistemas até dez vezes, com algumas empresas operando em três turnos. Entretanto, as capacidades da Ucrânia foram quase totalmente eliminadas e o país depende inteiramente do Ocidente, que não se importa que as suas entregas de armas violem as leis internacionais e ainda não percebeu que nunca conseguirá atingir os seus objectivos no que diz respeito à Rússia. Putin concluiu assim este raciocínio:
“Terão de compreender isso. Penso que o farão gradualmente”.
Contar com a inteligência e clareza de percepção dos líderes ocidentais para alcançar a paz não será com certeza uma expectativa real de Vladimir Putin. Perante a constante escalada do discurso e do apoio financeiro e logístico da Europa e dos Estados Unidos, que até já ponderam armar a Ucrânia com dispositivos nucleares, é até e ao contrário razoável considerar que a única solução boa para esta guerra seja aquela em que a Rússia conclua a sua operação militar de acordo com os objectivos fundamentais de Putin, e de forma convencional. Todos os outros cenários são catastróficos.
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