O documentário em baixo, que ilustra a actual situação em Gaza, é um horror. É muito difícil de ver e de digerir. O ódio, a violência, a insanidade, o desespero, são insustentáveis. Vivemos de facto tempos dantescos e ao assistir a este festival luciferino surgem apenas argumentos em favor de uma convicção que alimento há muito anos: o Sapiens não mostra evolução moral. Isto que vemos neste vídeo e que está a ocorrer agora, na Palestina, podia ocorrer no século XX, no século XI ou há quatro mil anos atrás. A diferença está na tecnologia, e apenas na tecnologia. A barbárie é intemporal.
O documentário é da Al Jazeera, mas aqui não há nada que enganar, porque muitas das imagens provêm das próprias forças armadas israelitas, porque a destruição e o número de baixas é certificado por várias organizações internacionais e independentes, porque nem Hollywwod conseguiria fabricar este nível de destruição, porque muito dos testemunhos são excessivamente pavorosos para serem ficcionados, porque na verdade os sionistas nem escondem o orgulho – e em certos casos, a sinistra alegria – pela orgia sanguinária.
No fim de Junho, tinham morrido na Faixa de Gaza 38.000 pessoas e 60% das infraestruturas estavam completamente destruídas. Um terço dos mortos são crianças. Os números não incluem os milhares de desaparecidos que ainda se encontram debaixo dos escombros.
Civis e jornalistas são abatidos indiscriminadamente. Os prisioneiros são humilhados, espancados, torturados, violados e mutilados. O exército israelita usa civis como escudos humanos e a fome como arma de guerra. Os seus soldados entram nos domicílios que os palestinianos foram obrigados a abandonar e vestem-se com a roupa interior das mulheres, encenando coreografias que publicam depois nas redes sociais. Hospitais, universidades e escolas são demolidos sistematicamente. Há vastas áreas de Gaza em que não se vê um edifício de pé. Os escombros estendem-se por todo o horizonte.
Os sionistas estão a implementar todo um rol de atrocidades, crimes de guerra e violações do direito internacional em Gaza e, digam o que disserem, não há justificação possível para a actividade genocida.
Não recomendo de todo este vídeo a pessoas mais susceptíveis, porque é uma coisa mesmo tenebrosa. Mas recomendo-o sim, àqueles que ainda defendem Israel como uma força civilizadora no Médio Oriente. Porque se isto é civilização, então o melhor é voltarmos a viver em cavernas.
Neste outro clip, Glenn Greenwald entrevista o realizador do documentário, o britânico Richard Sanders, que, para além de atestar sobre a fidedignidade das imagens e dos factos relatados no seu trabalho, articula sobre a hedionda situação no terreno, os detalhes distópicos dos bombardeamentos israleitas – que resultam da utilização de inteligência artificial para detectar alvos e que atingem preferencialmente esses alvos quando eles se encontram em casa, com as suas famílias – e o envolvimento do Ocidente na chacina.
Este é o retrato do inferno na Terra. E por muito que o islão seja antagónico dos valores ocidentais – e é – temos que nos perguntar se o caminho que Israel e o bloco Ocidental estão trilhar no Médio Oriente não é afinal muito semelhante – em valores e praxis – àquele que criticamos nos islamitas.
Marco Aurélio, um cristão antes de Cristo, escreveu um dia:
“A melhor forma de nos vingarmos dos nossos inimigos é não sermos como eles.”
Na Palestina, estamos a ser como os nossos inimigos. E assim sendo, nunca poderemos sair vitoriosos. Porque sem a virtude moral, nenhuma guerra é vencida.
Paulo Hasse Paixão
Publisher . ContraCultura
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