Seria completamente adequado aos deprimentes tempos que vivemos que a III Guerra mundial começasse com uma mentira. E com uma mentira disseminada pela imprensa.

Depois de ter irresponsável e levianamente afirmado que o míssil que caiu na Polónia na semana passada tinha sido disparado por forças russas, a Associated Press emitiu uma correcção oficial ao seu dislate de terça-feira, que poderia ter desencadeado uma cadeia de acontecimentos que conduziria a um cenário dantesco. Desculpam-se os activistas do apocalipse assim:

“A The Associated Press errou, com base em informações de um alto funcionário dos serviços secretos americanos que falou sob condição de anonimato.”

 

 

Esse erro alimentou um dia de incessante de belicismos com base na alegação de que a Rússia tinha atacado um membro da NATO. A correcção, incrivelmente embaraçosa, afirma ainda:

“Relatórios posteriores mostraram que os mísseis eram de fabrico russo e muito provavelmente disparados pela Ucrânia em defesa contra um ataque russo”.

E se da próxima vez que isto acontecer, for demasiado tarde para uma “correcção”?

Uma declaração da Casa Branca apoiou a avaliação da Polónia e da NATO de que a explosão da fronteira polaca de terça-feira foi afinal resultado de uma acção da Ucrânia.

“Não vimos nada que contradiga a avaliação preliminar das autoridades polacas de que esta explosão foi muito provavelmente o resultado de um míssil de defesa aérea ucraniano que infelizmente aterrou na Polónia”.

Isto embora a culpa recaia sobre a Rússia, porque a Rússia tem sempre culpa e tem culpa de tudo o que de horrível possa acontecer no mundo:

“Dito isto, quaisquer que sejam as conclusões finais, é evidente que a parte responsável por este trágico incidente é a Rússia, que lançou uma barragem de mísseis sobre a Ucrânia especificamente destinados a atingir infra-estruturas civis. A Ucrânia tinha – e tem – todo o direito de se defender”.

Entretanto, o antigo Congressista do Texas Ron Paul fez a pergunta certeira; será que estivemos quase a ser conduzidos ao apocalipse termonuclear por uma mentira?

 

 

Todas estas confissões tardias de que não se tratou de um ataque russo, surgiram convenientemente depois de o presidente dos EUA ter aproveitado o momento de confusão para anunciar outro pacote maciço de ajuda de emergência de 37 mil milhões de dólares para a Ucrânia.

Portanto, mais dezenas de milhões espoliados ao contribuinte americano em nome de interesses corporativos em Washington que aparentemente querem conduzir a América para uma guerra sem vencedores e sem justificação plausível.

 

 

Mas voltemos um pouco atrás. Antes da poeira resultante do incidente mortal ter assentado na aldeia fronteiriça polaca de Przewodów e de os investigadores poderem chegar a quaisquer conclusões definitivas, o público ocidental já estava a ser manipulado e avisado para se manter afastado das “teorias da conspiração”, uma vez que as primeiras manchetes da corrente dominante – empurradas especialmente com base nas alegadas declarações de um funcionário anónimo dos EUA numa reportagem da Associated Press – saíram rapidamente, embrulhadas desta forma:

“Mísseis russos atingem a Polónia, matando dois civis”.

O “Artigo 5” do tratado de defesa colectiva da NATO, que muitos receiam que seja invocado para espoletar a III Guerra Mundial, começou a ser referido no Twitter, uma vez que os oficiais ocidentais estavam a emitir declarações de “solidariedade”. Quase imediatamente e sem provas, o Presidente da Ucrânia Volodymyr Zelensky exigiu “acção” do Ocidente sobre a suposta agressão contra um membro da NATO:

“Atingir território da NATO com mísseis… Trata-se de um ataque com mísseis russos à segurança colectiva! Isto é uma escalada realmente significativa. É necessária acção.”

Depois, à medida que as imagens do local da explosão circulavam amplamente na Web, levando até fontes ocidentais a expressar dúvidas de que o projéctil tivesse sido lançado pela Rússia, entrou em cena o insuportável ministro dos negócios estrangeiros da Ucrânia, que tentou antecipar-se ao que ele considerava como uma “teoria da conspiração” promovida pela Rússia. Tal como em muitos outros aspectos desta guerra, algumas das questões mais óbvias foram rapidamente interditas, antes mesmo de poderem ser colocadas.

 

 

Varsóvia parou então de falar do Artigo 5º, mas depois propôs o Artigo 4º como base para uma reunião de emergência de segurança da NATO para quarta-feira, que apela a “consultas” no caso de um país membro estar sob ameaça.

Mas que diferença fazem algumas horas só, e uma recusa em saltar cegamente para a guerra! Primeiro, o Presidente Joe Biden, num raro ataque de lucidez, disse explicitamente que seria “improvável” que o míssil tivesse origem na Rússia. Com base nas provas emergentes disponíveis, parecia claro que se tratava mais provavelmente de um míssil antiaéreo ucraniano errante.

“Considerando a trajectória, é improvável que [o míssil] tenha sido disparado da Rússia. Mas vamos ver.”

Portanto:

 

 

Recorde-se que a reacção inicial do Kremlin foi que ou a Ucrânia ou a Polónia estavam a encenar uma “provocação deliberada” ao acusarem a Rússia de um acto de agressão. Os funcionários de Varsóvia tinham mesmo nas horas seguintes exigido que a Rússia assumisse a responsabilidade pelo sucedido e que se retractasse.

Na quarta-feira, funcionários da Polónia e da NATO também fizeram uma inversão do relatório inicial que atribuia responsabilidades a Moscovo. O Presidente polaco Andrzej Duda disse que a explosão que matou duas pessoas seria um “acidente infeliz” e não um “ataque intencional”. De acordo com a Axios, Duda acrescentou que o projéctil que causou a explosão era “muito provavelmente” de fabrico russo, mas que não existiam provas de que se tratava de um projectil disparado pelas forças armadas russas.

A circunstância é afinal absolutamente rotineira porque o arsenal de mísseis antiaéreos da Ucrânia é quase inteiramente fabricado pela Rússia, particularmente os seus S-300.

Entretanto, após uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da Aliança do Atlântico Norte, o seu Secretário-Geral, Jens Stoltenberg, emitiu uma avaliação semelhante, afirmando que se tratava muito provavelmente de um míssil ucraniano:

“A nossa análise preliminar sugere que o incidente foi provavelmente causado por um míssil de defesa aérea ucraniano disparado para defender o território ucraniano contra ataques com mísseis de cruzeiro russos.”

 

 

Salientando que a investigação sobre a explosão ainda estava em curso, declarou:

“Não há evidências de que este tenha sido o resultado de um ataque deliberado. E não temos qualquer indicação de que a Rússia esteja a preparar acções militares ofensivas contra a NATO”.

Como era de esperar, Jens Stoltenberg evitou abordar o histerismo criminoso de Zelensky no dia anterior, que pressionava a NATO a retaliar com acções militares, prosseguindo com a atribuição de responsabilidades à Rússia pela guerra e pela série de acontecimentos que levaram à explosão mortífera na fronteira:

“Mas deixem-me ser claro. Isto não é culpa da Ucrânia. A Rússia tem a responsabilidade última, pois continua a sua guerra ilegal contra a Ucrânia.”

Os oficiais da NATO continuam em conversações para determinar um caminho a seguir, mas como todo o drama se dissipou no espaço de dois ou três dias, é provável que a Aliança acabe por esquecer o assunto.

Mas que poderá acontecer da próxima vez que uma tragédia semelhante ou até mais violenta se desenrolar na fronteira de um estado membro da NATO ? Irá a mesma narrativa fraudulenta, do género “a Rússia está a atacar a NATO”, prevalecer antes que alguém faça perguntas simples e conduza a mais elementar investigação sobre os factos? Será que os tambores de guerra vão eclodir antes que os factos sejam conhecidos? Será o horizonte agredido por cogumelos apocalípticos antes que o cepticismo racional perturbe o “consenso”?

É que este incidente, logo à partida, deveria até ter levantado muitas dúvidas a qualquer político ou jornalista com dois milímetros de cerebelo: se a Rússia quisesse atacar um país da NATO iria começar por lançar um míssil defensivo sobre uma pequena aldeia na Polónia?

A probabilidade de um conflito aberto entre a NATO e a Rússia sobe a cada dia. E a suspeita de que esse conflito seja justificado por uma mentira ou um facto fabricado não é de todo infundada. Considerando o seu constante esforço para intensificar as tensões internacionais a propósito da guerra na Ucrânia, através da disseminação de propaganda e da divulgação das mais aberrantes falsidades, acham os “jornalistas” da Associated Press e de toda a imprensa mainstream que são imunes ás consequências devastadores de uma guerra termo-nuclear? Acreditam estes desgraçados que as “autoridades” reservaram um luxuoso abrigo subterrâneo só para eles, como prémio pela sua colaboração inestimável para o eclodir do apocalipse?

Já em relação às perguntas que se seguem, é melhor esperarmos pelas respostas confortavelmente sentados.