Porque Deus enviou o seu Filho ao mundo, não para que condenasse o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por ele.
João 3:17

 

O inevitável aconteceu no fim da Novembro, quando o Papa Francisco destituiu o Bispo Joseph Strickland da sua Diocese de Tyler, Texas, por razões ainda não oficialmente explicadas e depois de ter sido iniciado, em Junho, “um inquérito exaustivo a todos os aspectos da governação e liderança da diocese”.

De acordo com uma declaração divulgada no sábado pelo Cardeal Daniel DiNardo, da Arquidiocese de Galveston-Houston, que supervisiona a diocese de Tyler, a recomendação dada ao Papa foi a de que “a continuação do Bispo Strickland no cargo não era viável”.

Apesar dos relatos de que” questões de governação, assuntos financeiros e prudência básica” motivaram a investigação a Strickland, não foram mencionadas quaisquer preocupações administrativas numa conversa de 9 de Novembro entre o bispo e o Núncio Apostólico nos Estados Unidos, o Cardeal Christophe Pierre. Em vez disso, o Núncio citou como áreas de preocupação a “fraternidade de Strickland com os seus irmãos bispos”, a sua suposta incapacidade de implementar a Traditionis Custodes – as restrições do Vaticano à celebração da forma latina da Missa anterior a 1969 -, a sua presença “ostensiva” nas redes sociais e a falta de apoio ao Sínodo sobre a Sinodalidade, cuja agenda herética já foi documentada no ContraCultura.

Quando Strickland, que foi nomeado Bispo de Tyler há mais de 10 anos, recusou o convite para se demitir do cargo, o Santo Padre mostrou-lhe pessoalmente a porta.

Acontece que Strickland recebeu a “visitação apostólica” de 24 de Junho dias depois de ter liderado uma procissão de oração em resposta à homenagem feita pelos Dodgers, o franchise da liga profissional de baseball americana, a um grupo LGBT de ódio blasfemo e anti-católico, as “Irmãs da Indulgência Perpétua2, numa data que coincidiu com a Festa do Sagrado Coração de Jesus. O timing do Vaticano em tudo isto foi, como sempre, impecável.

Uma análise das questões sobre as quais o Bispo Strickland se pronuncia não deve deixar dúvidas aos católicos sobre a forma como Roma considera este prelado ortodoxo, humilde e corajoso, e sobre a influência súbtil que tem entre os católicos americanos. Strickland rotulou as políticas do aborto e do “casamento” entre pessoas do mesmo sexo como ideias trans-humanas que estão a ser avançadas como parte de uma “agenda sem Deus”. Tem sido um crítico acérrimo dos funcionários públicos que se identificam como católicos, mas que rejeitam a doutrina católica sobre o mal do aborto, e tem defendido a não recepção da Sagrada Comunhão em estado de pecado mortal.

Nas vésperas do suposto Sínodo sobre a Sinodalidade, guiado pelo Espírito Santo e tautologicamente denominado Sínodo do Vaticano, que todo o católico pensante entende ser uma via indirecta para introduzir grandes mudanças na Igreja, Strickland publicou uma mensagem apelando aos católicos para que se agarrem às verdades da fé. Apelou à cautela contra “qualquer tentativa de forçar uma fé que fala de diálogo e fraternidade enquanto tenta remover a Paternidade de Deus”.

 

O Bispo Joseph Strickland da Diocese de Tyler . Páscoa 2013 . Wikimedia Commons

 

Adivinhe quais os bispos que Roma deixa em paz.

Por isso, não é coincidência que Strickland tenha de repente os cães do anti-papa a rondar a sua diocese. Adivinhe, caro leitor, quais os bispos que não receberam uma visita no Verão passado? O Cardeal Blaise Cupich, da Arquidiocese de Chicago, que em Junho celebrou uma missa para um grupo católico LGBT que comemorava 35 anos de impropérios, não vai receber nenhuma batida ameaçadora à porta da sua reitoria. O Cardeal Wilton Gregory e o Cardeal Joseph W. Tobin, em cujas respectivas Dioceses de Washington D.C. e Newark, New Jersey, foram ministradas missas de celebração da sodomia, têm rédea livre. De facto, Cupich, Gregory e Tobin, juntamente com o Arcebispo Paul Etienne, que permitiu a realização de um piquenique de orgulho gay numa paróquia notoriamente heterodoxa de Seattle, foram todos nomeados pessoalmente pelo Papa Francisco como delegados à primeira assembleia geral do Sínodo sobre a Sinodalidade. Não por acaso.

Os desafiantes bispos alemães, que acham que a igreja católica deve abençoar o sexo fora do casamento, as uniões de facto, os matrimónios civis e os casamentos homossexuais, têm direito a via verde do Vaticano. O Cardeal Claude Hollerich, arcebispo do Luxemburgo e presidente da Comissão das Conferências Episcopais da União Europeia, que no ano passado afirmou que a Igreja precisava de actualizar o seu ensino sociológica e cientificamente incorrecto sobre a homossexualidade, foi mais tarde escolhido a dedo pelo Papa Francisco para servir como relator geral do Sínodo.

Apesar de, à primeira vista, a bênção das uniões entre pessoas do mesmo sexo ter sido anulada, o Papa Francisco está a permitir que tudo continue na mesma. Isto apazigua a máfia do arco-íris, ao mesmo tempo que permite que os  conservadores mais conformistas durmam tranquilamente à noite, satisfeitos por tudo estar bem em Roma. Não está.

Entretanto, o Vaticano persegue impiedosamente o seu verdadeiro antagonista: os ortodoxos, os fiéis e os tradicionalistas. A destituição do Bispo Strickland transcende o homem e a sua diocese. Trata-se de um conflito entre aquilo em que os católicos devem acreditar para a salvação das suas almas e aquilo que os apóstatas gostariam de ver professado.

 

O Bispo do Texas no trilho de Santo Atanásio.

Se quisermos ver as coisas pelo lado positivo, o Bispo Strickland está a seguir as ilustres pegadas do venerado pai da Igreja primitiva, Santo Atanásio de Alexandria, que ganhou a distinção de ter sido levado ao exílio cinco vezes, durante um período cumulativo de 17 anos, por um bando de clérigos desonestos, empenhados em espalhar a heresia ariana. O herege sacerdote ariano Ário começou a disseminar este veneno pouco depois do Édito de Milão de 313 ter posto fim à perseguição dos cristãos em todo o Império Romano. A mentira de Ário, segundo a qual Jesus, o Cristo, não é Deus mas sim uma criatura de Deus viola o coração da doutrina trinitária. Porque se o Logos de João não era um Deus verdadeiro, mas uma criação de Deus, toda a glória de Cristo fica “a meio caminho”.

“Não é assim!” disse o gentil mas intransigente Atanásio no seu famoso texto “Sobre a Encarnação do Verbo”, publicado pouco antes da explosão ariana:

“A renovação da criação foi efectuada pelo mesmo Verbo que a fez no princípio. O Pai Único empregou o mesmo Agente para ambas as obras, efectuando a salvação do mundo através do mesmo Verbo que fez no princípio.”

 

Ícone de Santo Atanásio de Alexandria . Wikimedia Commons

 

Mesmo depois do arianismo ter sido condenado no Concílio de Niceia, em 325, e do seu principal instigador ter sido admoestado, o movimento persistiu e até pareceu prevalecer. Atanásio, como bispo de Alexandria, defendeu a fé autêntica em Cristo e, assim, viu-se contra mundum (contra toda a gente). Naturalmente, os seus opositores não o enfrentaram com base em fundamentos teológicos – porque a sua tese não tinha qualquer fundamento – mas procuraram, em vez disso, minar a sua credibilidade e persegui-lo, lançando alegações mesquinhas e difamatórias.

Durante 30 anos, os inimigos de Atanásio manipularam as lealdades, prioridades e fraquezas de sucessivos imperadores e papas para apresentar falsas acusações contra ele, que iam desde a apropriação e gestão incorrecta dos bens da Igreja até à sedição, promoção da violência e até mesmo homicídio.

Após o seu quinto exílio, Atanásio foi reintegrado na sua sede, onde permaneceu, triunfante, até ao fim da sua vida, e desde então tem sido louvado como um pilar da fé católica. É um dos quatro santos que rodeiam o trono de S. Pedro na magnífica escultura barroca que se encontra na Basílica do Vaticano. C.S. Lewis disse o seguinte sobre Atanásio:

“É sua a glória de não ter mudado com os tempos. É sua a recompensa de permanecer agora, quando esses tempos, como todos os tempos, se diluíram.”

Tal como Santo Atanásio, o Bispo Strickland opõe-se resolutamente a uma reinvenção da doutrina que abalaria os próprios fundamentos da Igreja. O bispo de Lyon do século II, S. Ireneu, avisou que todas as heresias têm em comum o seu ataque insidioso a Jesus Cristo plenamente humano e plenamente divino. A heresia, ao rebaixar a lei de Deus à condição de meras sugestões, não é diferente. Se a revelação divina pode sempre ser “melhor interpretada”, então com que padrão Cristo julga? E se Ele não pode julgar, Ele não pode redimir; e se Ele não pode redimir, o homem não pode ser salvo. Jesus Cristo passa a um mero e moderado profeta, e toda a fé cristã é reduzida a uma mentira.

Mas não é uma mentira, e o bispo Strickland sabe disso, e é por isso que intuiu que o ataque de que foi alvo é motivado por

“forças dentro da igreja que rejeitam a verdade dos evangelhos”.

Acontece que a Igreja deve ensinar o que Cristo ensinou, independentemente desses ensinamentos serem mais ou menos populares, mais ou menos politicamente correctos, mais ou menos compagináveis com modas, épocas, maneirismos filosóficos e desvios teológicos.

Os homens que actualmente puxam as alavancas do poder em Roma parecem estar a a agir com um cinismo descomprometido em relação às verdades fundamentais enunciadas por Cristo. Apesar disso, os católicos devem evitar a armadilha e resistir à tentação de abandonar a Igreja. São insondáveis os desígnios do Senhor e se Francisco ocupa agora a cadeira de Pedro, por alguma razão será, por muito difícil que nos seja compreender a situação.

Aos cristãos em geral e aos católicos em particular pede-se agora que suportem, como o Bispo Strickland e como Atanásio de Alexandria, a condição de contra mundum. E que a suportem em paz de espírito e de consciência tranquila. Porque como todos nós crentes na verdade do Redentor sabemos bem, Ele não veio para condenar o mundo, por muito injusto e iníquo e difícil de compreender que seja o mundo, mas para o salvar.

 

Papa retira privilégios do Vaticano a cardeal conservador dos EUA.

Num complemento de última hora a esta notícia, soube-se no fim da semana passada que o Papa Francisco retirou ao cardeal americano Raymond Burke o apartamento onde vivia e o seu salário.

Um funcionário do vaticano, que falou sob condição de anonimato, participou na reunião em que o papa fez o anúncio da decisão aos seus assessores seniores.

O funcionário citou o Papa dizendo que Burke, um cardeal conservador crítico do actual pontificado, estava “a trabalhar contra a Igreja e contra o papado” e que tinha semeado “desunião” na Igreja.

Quando é mais que nítido que quem trabalha contra a igreja e cria desunião entre os crentes é o anti-papa Francisco, que persegue abertamente, com um autoritarismo que há séculos não se via no Vaticano, todo e qualquer opositor ao seu mandato herético.