O Ministério Público Federal (MPF) instou o ministro do Supremo Tribunal Eleitoral, Alexandre de Moraes, a exigir que as principais redes sociais – incluindo Instagram, TikTok, Facebook, YouTube, Twitter e LinkedIn – forneçam dados detalhados sobre todos os seguidores do presidente Jair Bolsonaro.

O requerimento parte de uma investigação em andamento sobre alegadas actividades “criminosas” de Bolsonaro, que foi iniciada apenas dois dias após os eventos de 8 de janeiro em Brasília, quando milhares de apoiantes de Bolsonaro entraram no Congresso Nacional. O incidente em questão gira em torno de um vídeo, posteriormente removido, no qual Bolsonaro critica o sistema eleitoral.

À frente da investigação dos acontecimentos de 8 de janeiro, Carlos Frederico Santos, o subprocurador-geral da República, também solicitou ao ministro Moraes que renove a intimação para que o Meta forneça cópias do polémico vídeo. Além disso, Santos pediu relatórios detalhados sobre a pegada digital do vídeo, incluindo métricas como visualizações, gostos, partilhas, republicações, comentários e quaisquer outras interacções quantificáveis.

Ampliando ainda mais e se possível o escopo do requerimento, a PGR também solicitou o acesso a todos os posts de Bolsonaro sobre eleições, urnas electrónicas, Tribunal Superior Eleitoral, Supremo Tribunal Federal e Forças Armadas.

Ironicamente, Santos manifestou firme resistência a duas propostas semelhantes feitas anteriormente por procuradores do Ministério Público Federal. Essas propostas, apresentadas em petição durante o inquérito, requeriam depoimentos de especialistas independentes da área da comunicação política sobre movimentos extremistas e seguidores de Bolsonaro. Mas para o procurador Santos, encontrar um especialista capaz de fazer uma vigilância imparcial dos grupos de seguidores de Bolsonaro, sem a influência de qualquer preconceito ideológico ou partidário, é de “extrema dificuldade”.

O acesso a informação que permite identificar milhões de cidadãos dissidentes é, obviamente, assustador e confirma que o Brasil se transformou numa tirania judicial.

 

Conhecendo o perfil autoritário de Moraes, Carlos Frederico Santos vai ter aquilo que quer.

Um dos personagens centrais da actual vida política brasileira é o juiz do Supremo Tribunal Eleitoral, Alexandre de Moraes, que tem excedido os seus poderes em cada decisão tomada, e que está a fazer dos tribunais que constitui ou dirige uma espécie de Gestapo. De tal forma que até o insuspeito New York Times, que gosta de Bolsonaro como quem gosta de pão com manteiga rançosa, se mostrou deveras apreensivo com as práticas totalitárias do sinistro personagem.

Na sua primeira acção enquanto Juiz do Supremo Tribunal Federal (de onde transitou depois para o Tribunal Eleitoral), Moraes ordenou a uma revista brasileira, a Crusoé, que removesse um artigo online onde denunciava que um outro juiz do Supremo era suspeito numa investigação de corrupção. Moraes chamou-lhe “notícia falsa”, sem apresentar qualquer tipo de evidência. Mais tarde e para sua infâmia, o juiz teve que levantar a ordem, depois de documentos legais provarem que o artigo estava correcto.

A seguir, Moraes ordenou às Big Tech que suspendessem dezenas de contas em redes sociais, apagando milhares dos seus posts, muitas vezes sem qualquer argumentário. Grande parte dos conteúdos obliterados não infringiam as regras dos próprios sites, mas as empresas obedeceram, para não se enfiarem em problemas com a autoridade constitucional de Brasília. E porque são quem são: sempre obedientes e entusiasmados censores.

Moraes não perseguiu apenas conservadores. Foi também atrás de personalidades da esquerda que não concordavam com o seu distorcido entender da democracia e do papel constitucional do Supremo Tribunal Federal. Quando um partido comunista brasileiro o apelidou de “skinhead” e afirmou que o Supremo deveria ser dissolvido, o juiz ordenou às tecnológicas que fechassem todas as contas desse partido, incluindo um canal no YouTube com mais de 110.000 assinantes. As Big Tech voltaram a anuir.

Depois, foi ainda mais longe. Em sete casos, ordenou a prisão de activistas conservadores acusados de “ameaçar a democracia, defendendo um golpe de estado ou convocando pessoas para comícios antidemocráticos”. Pelo menos dois ainda se encontram encarcerados ou em prisão domiciliária. Alguns casos foram iniciados pelo gabinete do procurador-geral, a mando de Moraes, enquanto outros foi ele próprio que desencadeou.

No caso mais mediático, Moraes ordenou a prisão de um congressista conservador depois deste o ter criticado e a outros juízes num livestream em que afirmou:

“Tantas vezes o imaginei a levar uma tareia na rua. O que é que vai dizer? Que estou a incitar à violência?”.

Por isto, o Supremo Tribunal Federal do Brasil votou 10/1 para condenar o congressista a quase nove anos de prisão, por incitamento a um golpe de estado. Bolsonaro perdoou-o no dia seguinte.

Entretanto a tensão entre Alexandre de Morares e os conservadores cresceu com o “Caso WhatsApp”, que envolveu um conjunto de empresários apoiantes de Bolsonaro. Baseado-se em conversações tidas nesta aplicação, Moraes mandou a polícia revistar as casas destes cidadãos e congelar as suas contas bancárias. Num momento de rara integridade, a imprensa mainstream brasileira condenou esta violação das garantias constitucionais mais elementares. A estação de televisão Bandeirantes, completamente pró-Lula, chegou a publicar um editorial nestes termos:

“Trocar mensagens, meras opiniões sem acção, mesmo que sejam contra a democracia, não constitui crime”.

O problema agudizou-se definitivamente quando este juiz draconiano e radical assumiu ainda mais poder, ao passar a exercer concomitantemente a presidência do Tribunal Eleitoral Federal, poucos meses antes das eleições presidenciais. Dificilmente os bolsonaristas passariam a confiar no processo eleitoral a partir daí.