O ContraCultura defende a tese de que por trás da criação há um acto inteligente, divino, transcendente, que possibilitou a realidade cósmica, ordenada, inteligível (até certo ponto), bela e promotora da vida.

Este é o segundo de 5 artigos que procuram explanar os argumentos dessa tese.

O primeiro capítulo desta série encontra-se aqui.

Podem ser apresentadas muitas provas diferentes que apontam para a existência de um desígnio prévio na natureza, mas nesta abordagem do Contra sintetizamos o argumento em sete grandes linhas de prova (as três que constituem este artigo e que se referem à cosmologia e mais quatro que vão constar de textos posteriores e que indexam à biologia).

Este texto tem como fontes primeiras os livros de Stephen Meyer, Signature in the Cell e Darwin’s Doubt.

 

Sobre a Origem do Universo.

O famoso Argumento Cosmológico é um axioma em três passos retóricos segundo o qual o universo requer uma causa primeira.

Tudo o que começa a existir tem uma causa.
O Universo começou a existir.
Portanto, o universo tem uma causa primeira.

O passo que a ciência pode abordar é o segundo – através da demonstração de que o universo teve um início. Essas provas são apresentadas em dois vectores fundamentais: o desvio para o vermelho e o efeito Doppler, e a descoberta da radiação cósmica de fundo em micro-ondas.

Em 1927, o astrónomo belga Georges Lemaître teorizou que o Universo começou com uma única explosão a partir de um estado densamente compactado. Essa explosão acabou por ficar conhecida como o Big Bang.

O Big Bang é um modelo da origem do universo que defende que este é finito em tamanho e idade. De acordo com esta teoria, o universo – incluindo todo o espaço-tempo – teve origem num único e poderoso evento de expansão, e continua a expandir-se.

Dois anos depois de Lemaître ter apresentado a sua teoria, o astrónomo Edwin Hubble publicou um estudo que a apoiava. O estudo de Hubble indicava que as galáxias se estão a afastar umas das outras e que o Universo está, de facto, em expansão. Como é que Hubble fez esta descoberta?

Da próxima vez que uma ambulância passar com a sirene a tocar, preste atenção ao tom do som. Quando a ambulância se aproxima, o tom é alto, mas depois, quando passa a gritar, o tom desce subitamente. A isto chama-se o efeito Doppler.

O efeito Doppler afirma que as ondas sonoras são ouvidas com uma frequência mais elevada quando a fonte do som se move na sua direcção, mas com uma frequência mais baixa quando se afasta de si. Embora as ondas de luz se comportem de forma diferente das ondas de som, ocorre um efeito semelhante.

As ondas de luz provenientes de um objecto que se aproxima terão a sua frequência deslocada para cima, em direcção à extremidade azul do espectro da luz visível. Da mesma forma, as ondas de luz provenientes de um objecto que se afasta são esticadas para uma frequência mais baixa e, portanto, deslocadas para baixo, em direcção à extremidade vermelha – um fenómeno conhecido como desvio para o vermelho (Red Shift).

A investigação de Hubble confirmou que as galáxias estão a afastar-se umas das outras ao descobrir um nível desproporcionadamente elevado de luz vermelha proveniente de praticamente todas as galáxias. Se todas as galáxias observáveis se estão a afastar umas das outras, o Universo está em expansão.

A confirmação final do modelo do Big Bang surgiu quando os cientistas descobriram a radiação de fundo em micro-ondas, prevista com exactidão, que resultou deste acontecimento massivo e explosivo e que podemos ainda hoje observar na estática de um televisor de cinescópio.

Em 1948, o físico George Gamow apresentou uma forma de resolver a controvérsia entre as teorias do Big Bang e do Estado Estacionário. Ele e outros cosmólogos teorizaram que, se o universo começou com um Big Bang, deveria haver radiação remanescente desse evento explosivo.

Esta radiação foi descoberta na década de 1960. No entanto, o debate continuou porque as medições foram efectuadas com instrumentos terrestres de precisão limitada.

Finalmente, no início dos anos 90, medições precisas do satélite Cosmic Background Explorer (COBE) da NASA indicaram que o Universo estava cheio de radiação com as propriedades exactas previstas pela teoria do Big Bang.

As medições do COBE confirmaram que toda a matéria do Universo primitivo explodiu a partir de um estado densamente compactado. Os cientistas tinham agora provas conclusivas de que o Universo tinha tido um início. Como explicou o astrofísico Neil F. Comins:

A detecção das micro-ondas cósmicas de fundo é uma das principais razões pelas quais o Big Bang é aceite pelos astrónomos como a teoria cosmológica correcta.

O que tudo isto significa é que existem provas muito fortes de que o Universo teve um início. Assim sendo, teve uma causa primeira. E se teve uma causa primeira, então faz sentido perguntar que tipo de causa primeira é essa. Forçosamente, será:

– Uma causa fora do universo;
– Uma causa capaz de gerar toda a matéria e energia do Universo;
– Uma causa capaz de ordenar essa matéria e essa energia num todo funcional, que em última análise possibilite a existência, por exemplo, de astrónomos.

Esta é a descrição de uma superlativa carga de trabalhos – uma que nenhuma causa material ou conjunto de causas materiais conhecidas parecem ser capazes de realizar. A necessidade de uma primeira causa tão poderosa e inteligente sugere fortemente um desígnio intencional por trás da origem do universo.

William Lane Craig tem um excelente vídeo que explica melhor este argumento:

 

 

Sobre o “ajuste fino” do Universo.

O termo “Big Bang” evoca imagens de uma explosão e, normalmente, quando pensamos numa explosão, imaginamos um acontecimento altamente caótico e estocástico que destrói qualquer ordem que esteja presente, em vez de criar ou preservar a ordem. O Big Bang não foi esse tipo de “explosão”. É muito melhor entendido como um “evento de expansão rigorosamente sintonizado”, em que toda a matéria e energia do Universo se estavam a expandir a partir de um estado de energia inimaginavelmente elevado. No entanto, a acompanhar essa energia havia controlo e orientação através de leis naturais que foram concebidas para produzir um universo habitável, um lar para a vida.

Consideremos alguns dos factores desse “ajuste fino” que tornam o nosso universo possível:

– Se a força nuclear forte fosse ligeiramente mais poderosa, então não haveria hidrogénio, um elemento essencial à vida. Se fosse ligeiramente mais fraca, então o hidrogénio seria o único elemento existente.
– Se a força nuclear fraca fosse ligeiramente diferente, não haveria hélio suficiente para gerar elementos pesados nas estrelas, ou as estrelas queimar-se-iam demasiado depressa e as explosões de supernovas não poderiam espalhar elementos pesados pelo Universo.
– Se a força electromagnética fosse ligeiramente mais forte ou mais fraca, as ligações atómicas e, consequentemente, as moléculas complexas, não se poderiam formar.
– Se o valor da constante cosmológica fosse ligeiramente mais alto, uma das consequências seria que as estrelas se tornariam demasiado quentes e o seu processo de combustão seria demasiado rápido. Se fosse ligeiramente mais baixo, as estrelas não entrariam em combustão e não seriam produzidos elementos pesados.
– Se esse valor fosse ligeiramente mais alto, os corpos celestes iriam afastar-se uns dos outros de tal forma que não existiriam galáxias nem clusters geradores de estrelas e o nosso céu nocturno seria completamente negro (por esta altura de expansão do universo os corpos celestes estariam para lá do horizonte observável). Se fosse ligeiramente mais baixo, o universo já tinha colapsado porque os objectos celestes seriam atraídos uns pelos outros de tal forma que aconteceria uma espécie de big bang ao contrário.

As leis e constantes finamente ajustadas do Universo são um exemplo da complexidade especificada na natureza. São complexas na medida em que os seus valores e definições são altamente improváveis. São especificadas na medida em que correspondem aos requisitos únicos necessários para a geração de vida biológica.

Eis um apanhado do grau de ajuste fino necessário a alguns desses valores para produzir um universo propício à vida:

Constante gravitacional: 1 parte em 1034
Força electromagnética versus força da gravidade: 1 parte em 1037
Constante cosmológica: 1 parte em 10120
Densidade de massa do universo: 1 parte em 1059
Taxa de expansão do universo: 1 parte em 1055
Entropia inicial: 1 parte em 1010123

O último item da lista – a entropia inicial do Universo – mostra um grau surpreendente de afinação. O que tudo isto revela é um cuidado e um planeamento incríveis, astronomicamente precisos e intencionais, que foram aplicados na elaboração das leis e constantes do universo, o que aponta inequivocamente para uma concepção inteligente. Como afirmou o prémio Nobel da Física Charles Townes:

“A conceção inteligente, tal como a vemos de um ponto de vista científico, parece ser bastante real. Este é um universo muito especial: é notável que tenha surgido desta forma. Se as leis da física não fossem exatamente como são, não poderíamos estar aqui. O Sol não poderia estar ali, as leis da gravidade, as leis nucleares, a teoria magnética, a mecânica quântica, etc., têm de ser exactamente como são para que estejamos aqui.”

Ainda assim, alguns cientistas ateus e adeptos da Teoria do Multiverso (que de científica não tem nada) argumentam:

“Deve haver um número enorme de universos e cada um deles é um pouco diferente. Este acabou por ser o correcto”.

Convenhamos, este é um postulado bastante fantasista e completamente indemonstrável, que assume a existência de um número incontável de universos e que as leis podem ser diferentes para cada um deles. É como ir ao Casino Estoril, perder cinco mil euros, mas ficar feliz porque entretanto num outro Casino em Las Vegas alguém tem um póquer de ases na mão. E, de qualquer forma, a premissa está condicionada a um motor metafísico, porque se há assim tantos universos a nascer a cada momento, tem que existir uma causa primordial e transcendente para eles todos.

Até seguindo a famosa formulação da Navalha de Ockham, percebemos que a possibilidade mais sensata, económica e lógica é a de que o nosso universo tenha sido planeado por uma mente inteligente, e por isso surgiu de forma tão especial.

Mais uma vez, William Lane Craig tem um vídeo fantástico que ajuda a perceber a relevância cosmológica do “ajuste fino” do universo.

 

 

Sobre o ajuste fino do nosso sistema solar.

Como o ContraCultura documentou recentemente, um paper publicado por uma equipa liderada por Lokesh Mishradá, doutorado em Astrofísica pela Universidade de Zurique e investigador da IBM, e publicado pela Universidade de Cornell, demonstra que a probabilidade de encontrarmos no cosmos sistemas solares arquitectados como o nosso, e um planeta com a mesma localização da Terra nesses sistemas solares, é extremamente remota.

Desde que, na última década, e principalmente depois do Telescópio Keplar ser colocado em órbita, os cientistas começaram a descobrir outros sistemas solares e a estudar as suas respectivas estruturas, percebemos que não há muitos sistemas multiplanetários como o nosso.

De facto, a maior parte dos sistemas são binários ou trinários, apresentado mais que uma estrela. Só o facto de termos apenas um sol já é bastante invulgar.

Além disso, os escassos sistemas multiplanetários que apresentam algumas similitudes com o nosso, como o 55 Cancri, têm arquitecturas muito diferentes, com gigantes gasosos localizados muito perto das estrelas e com distâncias entre planetas também substancialmente divergentes. Na verdade, entre os milhares de sistemas solares já observados e estudados pela ciência humana nos últimos 30 anos, nenhum tem uma estrutura semelhante ao habitat que deu origem à Terra.

O ordenamento dos planetas é importante porque, por exemplo, a posição exterior de Júpiter protege a Terra da acção destruidora de meteoritos, graças ao poder de atracção da sua massa gravítica, permitindo que na Terra as mesmas condições propícias à vida se mantenham inalteradas durante centenas de milhões de anos. Se Júpiter estivesse mais próximo do Sol e a Terra numa órbita exterior, a probabilidade do nosso planeta já ter sido pulverizado pelo arsenal balístico que, cíclica ou extemporaneamente, atravessa o sistema solar aumentava de forma exponencial, impossibilitando a evolução da vida para formas mais complexas.

 

 

Da mesma maneira, quando os planetas desenvolvem órbitas muito próximas entre si, a influência gravítica entre eles desestabiliza-os ciclicamente. Se a Lua, um pequeno satélite, tem o poder de mover marés na Terra, imagine-se a mútua e terra-transformadora perturbação e instabilidade que dois planetas com a massa de Saturno ou Neptuno podem desencadear um sobre o outro.

Acontece que o modelo matemático da equipa de Lokesh Mishradá calculou que os sistemas mais comuns integram vários planetas muito próximos das estrelas e muito próximos entre si, como é o caso do Trappist 1, que apresenta 7 planetas no espaço equivalente à distância entre Mercúrio e Marte. O modelo prevê também que a maior parte dos sistemas não são ordenados como o nosso, ou seja, não apresentam uma arquitectura em que planetas mais pequenos estão próximos do sol e os maiores estão mais afastados. Muitos sistemas têm planetas de volumetrias e massas bastante uniformes, outros tantos apresentam gigantes gasosos perto das estrelas e pequenos planetas sólidos mais distantes.

Apenas 1% dos sistemas solares serão ordenados como o nosso. A arquitectura multiplanetária que permite a estabilização das orbes interiores e contribui para aumentar as probabilidades de eclosão de vida biológica e do seu desenvolvimento no sentido da complexidade é assim deveras improvável.

Acresce também que a Terra é um planeta raro num sistema solar invulgar. O modelo concluiu que apenas 3% dos planetas de sistemas solares com arquitectura ordenada como a nossa se encontram dentro da “Zona Empírica Habitável” (ZEH), ou seja, estão a uma distância das suas estrelas que permite um estreito espectro de temperaturas favoráveis às condições geradoras de vida, mesmo que ao nível celular.

Devemos considerar que a água em estado líquido, que consideramos essencial à vida biológica, só existe entre os 0 ºC e os 100 ºC e que o espectro térmico do cosmos transcende largamente essa escala, oscilando entre o gélido zero absoluto, ou seja -273,15 ºC, e o calor inimaginável que ascende a números de tal forma astronómicos que são precisos mais de 27 zeros para os representar. A ZEH é assim fundamental para que possam surgir formas de vida baseadas na água.

E assim sendo: 3% dos planetas em 1% dos sistemas solares do universo apresentam semelhanças com a Terra.

Se a esta improbabilidade somarmos a igualmente invulgar permanência duradoura sobre as eras da magnetosfera da Terra, a região celeste em redor do nosso planeta na qual partículas carregadas são afectadas pelo seu campo magnético interior, percebemos que este tranquilo, equilibrado e simpático lugar cósmico em que residimos é um achado estatisticamente muito difícil.

E que deverá, por dedução lógica, resultar de um desenho inteligente.