Na Páscoa, celebramos a Paixão e a Ressurreição de Cristo. Apesar do Natal ser em definitivo a quadra mais popular do calendário cristão, para todos os efeitos é a Páscoa o momento central do cristianismo. A metafísica de Jesus não triunfa no berço, mas na Cruz, e do nascimento de Cristo temos apenas o relato de Lucas e Mateus. Da sua Paixão e Ressurreição oferecem-nos os 4 evangelistas detalhada reportagem.

O ContraCultura marca esta quadra com sete breves segmentos que a propósito de assuntos muito diferentes reflectem sobre o legado de Jesus Cristo e também sobre os atentados que esse legado tem sofrido nos últimos anos.

 

 

Sem Ressurreição não há Cristianismo.

Ressurreição de Cristo . Andrea Mantegna . Sec. XIV

 

É necessário que o Filho do homem seja entregue nas mãos de pecadores, seja crucificado e ressuscite no terceiro dia.
Lucas 24:7

 

A Ressurreição está no princípio e no fim, é o alpha e o ómega, do Cristianismo. Se Cristo de facto não ressuscitou dos mortos, a transcendência da sua mensagem perde muitas calorias e acontece-lhe o que lhe aconteceu no Alcorão: é despromovido a profeta.

É ao terceiro dia que a História começa. É quando as leis do homem soçobram e a Palavra se cumpre. É nesse preciso e assombroso momento que o cristão encontra a definição da verdade.

Tudo foi construído com laboriosa minúcia, suplícios da Paixão incluídos, para que aqui chegados, a intensidade dramática e o potencial redentor atinjam máximos literários: é quando as mulheres encontram o túmulo vazio que a narrativa bíblica atinge o seu apogeu.

Por isso, e por muito que queiram obliterar a Páscoa ou associá-la a ancestrais ritos pagãos; por muito que queiram transformar a cruz num coelho de chocolate e os trinta dinheiros em amêndoas açucaradas; por muito que evitem ou sujem a mais bela história alguma vez contada, a Semana Santa perdura no coração dos crentes e, contra as suas próprias convicções, no imaginário dos ateus.

Para além desta imediata conclusão, o bispo Barron ensina eloquentemente, neste sermão pascal, três outros axiomas que resultam da Ressureição: que vencendo a lei da morte, Cristo demonstra que a realidade não se limita ao mundo material que é experimentado sensualmente pelo ser humano; que a liberdade sobrevive metafisicamente à materialidade da tirania e que a salvação é um divino gesto de amor estendido a toda a humanidade.

 

 

 

Jesus Cristo não é chamado para a conversa.

Aqui há uns tempos, o Bloco de Esquerda decidiu lançar uma campanha a favor da adopção gay com este repugnante slogan:

Jesus Cristo também tinha dois pais.

Para além da afirmação ser literalmente falsa, José não é pai de Jesus; para além da infantilidade do argumento e da falência da imaginação que é transparente na baratíssima justaposição semântica; será talvez necessário ponderar sobre a tolerância (e a cumplicidade) que tem merecido até aqui esta organização de arruaceiros chegavaristas. E se este tipo de alarvidade radical deve ser permitida a um partido político com assento na Assembleia da República. É que Portugal é um país cristão. É cristão na sua origem e na sua identidade. Na sua história e na sua alma. É cristão de literatura e de revoluções. É cristão por causa da sua geografia e da sua meta-geografia. É cristão e não poderia alguma vez ser outra coisa. Se Portugal deixar de ser cristão, deixa de ser Portugal. Neste país, até os ateus são cristãos. Os infelizes do Bloco também o são, mas não têm a inteligência, a cultura e a sensibilidade para darem por isso. Não percebem que Platão era tão cristão como Cristo, que Cristo era tão marxista como Marx e que sem eles, Proudhon e Bertrand Russel não tinham escrito uma página que fosse das cartilhas que os bloquistas conservam cabalistacamente na miséria das suas bibliotecas privadas.

O que é realmente grave no Bloco de Esquerda, é que o ódio intenso que manifesta pelos valores da civilização ocidental resulta apenas da ignorância de tudo e de um niilismo básico, intelectualmente plastificado, pueril, populista (na mais barata acepção do termo), que triunfa sempre pela negativa.

 

 

Velázquez e o sacrifício.

Cristo na Cruz . Diego Velázquez . 1632

Esta é talvez a mais bela representação de Cristo na cruz na história da arte. Certamente inspirado pela viagem que, dois anos antes, terá feito a Itália – para admirar in loco os mestres do renascimento – Velázquez opta por um registo austero, embora de grande intensidade dramática, num trabalho despido de artifícios bíblicos mas magnificamente ornamentado de espinhos e pregos e feridas e sangue e sofrimento. Cristo está aqui a sós com o seu destino, face a face com a morte, na noite profunda do sacrifício.

Nenhuma representação digital faz justiça a este quadro. Está no Prado e só a textura e a diversidade mais que subtil dos negros de fundo merece uma hora de pura contemplação. Depois de sermos confrontados com esta obra de transcendente poderio iconográfico é impossível classificar Velázquez no âmbito do Barroco. O homem transcende escolas e maneirismos porque, não estando atrás nem à frente, está para além do tempo. Esta representação de Cristo na cruz está muito para além do tempo.

Acresce que o sacrifício de Cristo é um momento particularmente contemporâneo. Agora que uma certa civilização ocidental vive aparentemente esquecida (ou ignorante) de que não há glórias sem sacrifícios. De que é preciso morrer para salvar. De que é preciso retribuir em lágrimas as alegrias: lamentavelmente, não há almoços grátis na cadeia de fast food que é a história dos homens. E Cristo está aqui exposto e nú, está aqui profundamente humano, está aqui frágil e moribundo para o provar.

 

 

Jesus nunca cancelou ninguém.

Esta senhora no clip em baixo, entrevistada pela Megyn Kelly, Kathie Lee Gifford de seu nome, é guionista de Hollywood e portanto um produto da mentalidade elitista que hoje em dia representa em boa medida aquilo que o Contra considera o inimigo. Mas, para surpresa – e salvação moral –  do cepticismo deste redactor, escreveu recentemente um livro, “The Jesus I Know: Honest Conversations and Diverse Opinions About Who He Is”, que, apesar de integrar entrevistas com horrorosos personagens que infectam totalmente as classes altas da Califórnia, que apesar de manifestar ideias acríticas e até ignorantes sobre Cristo e a sua mensagem, não deixa de ser um caminho de pacificação da sociedade.

Porque só através dos valores cristãos, e do seu vencimento, é possível a paz. A única maneira plausível de resolver sem sangue o conflito civilizacional que está em curso, é através de Cristo. Dos ensinamentos de Cristo. Nem que seja porque: Cristo nunca cancelou ninguém. Nunca censurou ninguém. Nunca perseguiu ninguém. Nunca se vingou de ninguém. Nunca odiou ninguém.

Na corrente etapa da existência, os ensinamentos do nazareno são muitíssimo difíceis de cumprir, é verdade. São na verdade excessivamente exigentes com a condição humana e com as contingências de um século em que o mal absoluto grassa triunfante. Essas exigências fazem porém todo o sentido, porque o que ele demanda não é complacência ou comiseração. O que ele ensina não é nada que nos transporte para os nossos sonhos de prosperidade maluca, afirmação egotista, realização profissional, completude passional. O que ele prega é transcendência. O que ele espera é que cada um de nós faça o possível e o impossível para superar a nossa triste condição.

Como Platão, Jesus não está interessado na fragilidade da condição humana mas na remota hipótese de sermos dignos para além dela. De sermos corajosos para além dos nossos instintos. De sermos generosos para além dos nossos interesses. De sermos verdadeiros para além das conveniências. De sermos justos para além da nossa pobre e enviesada noção empírica do que é a justiça.

Ouvir esta senhora, mesmo que por breves minutos, faz de qualquer cristão um cristão melhor. Mais tolerante. Mais justo. E se calhar até menos humano, no sentido em que Cristo é desumano nas suas exigências.

Sete minutos de redenção.

 

 

Os compadres de Harvard querem casar Jesus Cristo. A qualquer preço.

Confiar num produtor de filmes pornográficos como fonte fidedigna para uma tese bombástica; inventar e forjar documentos; usar de incesto académico e de compadrio siciliano; saltar sobre a fase de peer review. Faz-se, nos labirintos e nas sombras da célebre universidade de Massachusetts, o que for preciso fazer, mas o Crucificado há-de por força contrair matrimónio!

Os interpretes desta inacreditável rábula, que Dinesh D’Souza conta bem contada, representam lindamente a elite intelectual e moral do século XXI, no Ocidente. Um momento no tempo e no espaço em que os sábios vão nus.

 

 

Cristianismo sem Cristo: Anti-cristo.

Muito a propósito do que relata Dinesh D’Souza, a invenção de um Cristo inexistente, por agenda política, ou a perseguição de um cristianismo sem referência aos verdadeiros ensinamentos do messias, por descargo de consciência, nunca acabam bem. Para já porque a falsificação de Jesus é uma obra diabólica por definição e esse diabolismo será sempre um trans-humanismo, como os senhores de Davos sabem muito bem. Este sacerdote ortodoxo, que o Contra, infelizmente, não conseguiu identificar, explica o raciocínio muito bem explicado.

 

E o nefasto produto do cristianismo sem Cristo, salta hoje à vista um pouco por todo o lado. Dois exemplos aberrantes:

 

 

 

Num mundo ao contrário, isto faz completo sentido.

Vontando a Harvard, essa incansável fábrica de heresias. Até aqui, existia um ser humano que acreditava em Deus, na célebre universidade. Entre os 600 desgraçados que fazem parte do corpo docente da mais prestigiada escola do Ocidente, havia para lá um esquecido e singular e doido rapazinho que levava a sério a história monoteísta da tradição judaico-cristã. Era, claro, o capelão. Foi com os porcos, entretanto. E para o substituir, o quadro dirigente da ilustre academia decidiu escolher um ateu. Um ateu como os restantes 600 ateus do restante corpo docente. Portanto, o actual capelão de Harvard é ateu. Que género de missa sairá daqui?


Não que os senhores de Harvard estejam a ter um ataque de originalidade. O ContraCultura já denunciou vários casos de situações similares, muitos deles no seio das próprias igrejas ditas cristãs, mas há mais, muitos mais.

 

 

Mas pensando bem, se até o actual Papa é ateu, porque raio há-se ser crente o capelão de Harvard ou fiel o arcebispo de Canterbury?
O mundo ao contrário. O mundo ao contrário. O mundo ao contrário.