No activo desde 1999, os We Are Scientists são uma banda sem explicação. Disparando em todas as direcções existentes entre o punk e o pop, os nova-iorquinos da Califórnia que, não sendo propriamente uns falhados como músicos, prefeririam, tudo indica, ter cumprido uma carreira na comédia, têm vindo a desenrolar nas duas últimas décadas, com desprendida constância e teimosa energia, a sua meada de poderosos manifestos, para se transformarem numa espécie de monstros confortavelmente instalados debaixo da cama da música popular contemporânea.
O Contra não vai recuar muito, antes de chegar onde é preciso. Começamos já em 2018 com o vendaval eléctrico que preenche pornograficamenrte metade do cartão de visita destes cientistas do rock.
Mas para além de música que dá vontade de ir fazer furos no mundo, “Megaplex”, numa ambição contraditória que é típica da banda, até começa por querer ser top of the pops, senão vejamos:
Os We Are Scientists gostam imenso de cruzar referências, misturar manias e andar para a frente e para trás no tempo, no ritmo e na voltagem. Ainda assim, em 2020 lançaram “Huffy”, um disco que é mais coerente com uma vontade apenas: a de foguetões.
Os clips deste álbum, cada um mais patético que o outro e em total assincronia com a música, épica e grandiloquente, deixam no audiente um desentendimento. Como é que se cria um produto rock deste calibre para depois o esbanjar com ridicularias? A conclusão natural e óbvia é que Keith Murray e Chris Cain têm horror de serem levados a sério.
“Lobes”: Turismo infinito.
Em Janeiro deste ano, a banda lançou o seu oitavo trabalho de estúdio. Investido num registo mais electrónico do que é costume, “Lobes”é um verdadeiro tratado em como deixar a audiência num perpétuo estado de embriaguez melódica.
Começando pelo fim que podia ser a abertura, um tema aveludado, lindíssimo, que é realmente um milagre pop e que, assim sendo, fica logo no ouvido do audiente, contrariando a regra de ouro da música alternativa, que geralmente leva mais tempo a cair bem nos tímpanos.
Este disco tem nitidamente a missão de elevar as nossas pequenas existências para palcos de dimensões grandiosas. Ou paisagens de um passado, que mesmo banal, se transforma rapidamente numa odisseia boa.
No corropio deste tele-transporte, somos subitamente levados a uma caverna do Bairro Alto, no paleolítico inferior de todas as coisas; e depois arrastados para um buraco no Cais do Sodré, no tempo em que tinha mais cores que o rosa; e de seguida enfiados em sítios igualmente obscuros, igualmente sagrados, a cada faixa que vibra: estações de rádio com X e discotecas onde o arame farpado desenhava a fronteira de S. Bento. Há aqui todo um universo de aventuras que se recuperam num refrão ou que são soltas num riff. Há aqui todo um turismo do passado a que regressas através da música de agora.
Num momento da história da música dita alternativa em que são cada vez mais raros os instantes de consolação, “Lobes” é um disco altamente aditivo e gratificante, para pôr a tocar e deixar ficar; um requintado, delicado trabalho que devolve, em loop, algum optimismo aos neurónios, alguma alegria aos sentidos.
Sendo de natureza eminentemente nostálgica, a música dos We Are Scientists tem perpétuas incidências no porvir; espécie de regresso ao futuro com o volume no máximo, marcha atrás que chega mais à frente, um acorde de cada vez.
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