Pode parecer estranho, mas, cientificamente falando, o nada é uma impossibilidade.

Imagine o leitor uma caixa. E que consegue retirar da caixa toda a matéria que está dentro dela. Imagine que, depois de todas as partículas e sub-partículas terem sido removidas, a caixa armazena apenas nada. Zero. Nicles. A caixa não tem, em rigor, nada lá dentro a não ser vácuo.

O problema é que o vácuo encerra ainda assim qualquer coisa: o campo quântico, que existe com ou sem partículas. Com ou sem matéria. E permanece lá, flutuante, nessa caixa. E é isso que se observa neste gif fantasmático: o comportamento do campo quântico em vácuo.

 

Quantum Fluctuations.gif3D visualization of quantum fluctuations of the QCD vacuum

 

A Teoria Quântica de Campo é, talvez, a que melhor explica e integra tudo o que até agora observámos e calculámos acerca da física subatómica, mas implica uma ideia de cosmos um pouco estranha: a matéria é um fluído contínuo, em certo sentido não atomizado, onde se plasma, de forma  interconexa e difusa, a realidade. Todos estamos assim instalados no mesmo campo de possibilidades. Todos somos espigas da mesma seara, que ondula constantemente ao sabor do tempo, da energia e das circunstâncias electro-magnéticas. Estamos associados não por relações entre átomos isolados, mas por fluxos dinâmicos de misterioso, senão insondável, comportamento.

Ninguém na verdade pode afirmar que a Teoria Quântica de Campo está correcta e é por isso que é uma Teoria. Mas este gif é uma projecção digital de mensurações reais: alguma coisa está a acontecer no vácuo, de facto. E esse fenómeno bizarro, por si só, dá que pensar.

Sabine Hossenfelder, que gosta imenso de dissertar sobre nada, aproveita para dissecar os diversos níveis de coisa nenhuma, para chegar à conclusão que, por muito que tentemos despojar a caixa imaginária de tudo o que lá dentro podemos encontrar, sobra sempre qualquer coisa. Seja tempo, que é uma dimensão da realidade, seja o potencial estatístico de alguma coisa surgir do nada, seja uma ideia de Deus.

A investigadora no Instituto de Estudos Avançados de Frankfurt aproveita para especular sobre temas que do nada derivam: é possível que o Universo tenha sido criado a partir do zero, sem proto-matéria nem energia despendida no processo? E, aceitando o velho desafio de Leibniz, porque raio existe alguma coisa em vez de coisa nenhuma? O facto do cosmos tornar praticamente impossível a ausência total de matéria ou de conceitos imateriais ou de potências estatísticas ou de flutuações de campo, esse evidente horror do vazio que é manifesto na termodinâmica de todos os dias não é um axioma auto-evidente. As coisas podiam muito bem não ser assim. As coisas podiam muito bem não ser.