Explosão contracultural por definição, o meme é uma manifestação do discurso popular prototípica do século XXI. O paralelo com as inscrições gráficas, geralmente obscenas e sempre satíricas, que eram prática corrente nas cidades do Império Romano, é evidente. O meme é a arte de pôr o dedo na ferida. Destina-se a provocar, a ofender, a instigar. É contundente e hilariante, trágico-cómico testemunho da contemporânea guerra cultural que se trava na web.

 

 

Esta manifestação de humor e crítica social, carregada intensamente por fenómenos ideológicos e intenções subversivas, não pretende ser um objecto estético. É, regra geral e intencionalmente, inestético, caótico e de nível técnico amador, espécie de veiculo anti-publicitário, sem deixar de ser publicista. O meme sabe da sua natureza transitória, do seu consumo volátil, do seu propósito imediato. Mas, como sempre acontece com qualquer actividade humana, as excepções à regra da fealdade não deixam de abundar.

 

 

Apesar do seu anonimato radical, encontramos frequentemente trabalhos miméticos de qualidade plástica e conceptual surpreendentes e que fazem recurso a técnicas miméticas muito diversas, da colagem à ilustração, da manipulação da imagem fotográfica às tecnologias de rendering e modulação 3D. O meme é um instrumento libertário, que não reconhece cânones nem segue métodos nem persegue a função artística, mas quando de recursos técnicos ou criativos mais sofisticadas depende a sua eficácia, usa-os, às vezes com resultados estética e formalmente notáveis.

 

 

Iconoclasta e clandestino por natureza, o meme copia, replica, pirateia, vandaliza. Não respeita direitos de autor nem condicionalismos comerciais. Não é politicamente correcto nem quer salvar o planeta. Não é judicioso nem moralista nem pretende mudar o mundo. E sendo independente como uma árvore sem raízes, dá-se bem em rede. É interactivo, anseia por audiências mas não é comprometido com elas. É prolixo e influente, é viral e contagiante, mas por convicção individual e não por convergência de interesses colectivos. É puro livre arbítrio.

 

 

Talvez por isso, os poderes instituídos declararam guerra ao meme, com a União Europeia na vanguarda desse ataque censório. Mas os verificadores de factos na imprensa, que se entretêm, maliciosamente, a verificar a veracidade do humor na web, os políticos que processam criadores de memes, as polícias que prendem pessoas por publicarem memes e as redes sociais que os censuram e restringem a sua divulgação, fazem também parte desse exército que pretende silenciar a vox populis.

 

 

O meme é um dos poucos instrumentos de protesto e sátira popular que restam nas democracias ocidentais. E por isso deve ser protegido. Por isso deve ser elogiado.