Reconhecendo que o título deste artigo é um meme que se escreve sozinho, não deixa de ser um facto que o Ministro dos Negócios Estrangeiros francês, vítima de um ataque histérico que se manifestou concomitantemente no eixo Berlim-Paris-Bruxelas, sugeriu que podia enviar tropas para a Dinamarca, caso Trump se decidisse a invadir militarmente a Gronelândia.

Mas o chefe da diplomacia francesa não está sozinho no seu zelo solidário e na sua guerreira fantasia de soldadinho de chumbo . A primeira-ministra dinamarquesa Mette Frederiksen recebeu também o apoio do demissionário chanceler alemão Olaf Scholz.

A Europa está em polvorosa com a perspectiva do Presidente dos EUA, Donald J. Trump, forçar a tomada – pela força ou pela guerra económica – da ilha da Gronelândia.

A intenção reiterada de Trump de assumir o controlo da ilha gelada decorre, segundo o próprio Presidente, de uma alegada necessidade de “segurança nacional”. Durante o fim-de-semana passado o novo inquilino da Casa Branca afirmou:

“Acho que a vamos ter. Não sei que direito tem a Dinamarca, mas seria um acto muito hostil se não permitissem que isso acontecesse, porque é para a protecção do mundo livre”.

Não se percebe lá muito bem o que é isso do ‘mundo livre’ e como é que a Gronelândia vai protegê-lo, sendo certo que por esta ordem de ideias Vladimir Putin também podia reclamar o território para protecção do ‘mundo cristão’, por exemplo. Tanto mais que a ideia, muito século XX, que Trump tem da América como nação defensora da liberdade e da civilização ocidental foi devidamente enterrada na primeira década deste século, com missas de finados já servidas em anos posteriores e ciclicamente.

Território semi-autónomo do Reino da Dinamarca, a Gronelândia é altamente estratégica devido à sua localização no Mar Ártico e é rica em metais raros. Ao contrário da Dinamarca, a extensa ilha de 56.000 habitantes não faz parte da União europeia, mas goza de um estatuto especial com acesso aos fundos da UE e liberdade de circulação para os gronelandeses, que são considerados cidadãos da UE. Além disso, a Gronelândia é abrangida pela cláusula de defesa mútua prevista nos Tratados da UE. Nos termos do n.º 7 do artigo 42.º, todos os Estados-Membros têm uma “obrigação de ajuda e assistência” se outro Estado-Membro for “vítima de agressão armada no seu território”.

O chanceler alemão Olaf Scholz afirmou na terça-feira, após um encontro com Frederiksen:

“As fronteiras não podem ser deslocadas pela força. A inviolabilidade das fronteiras é um princípio fundamental do direito internacional. O princípio deve aplicar-se a todos”.

É curioso que Scholz tanto se preocupe com as fronteiras de países estrangeiros, como a Ucrânia e a Gronelândia, e tão pouco com as suas próprias, que têm estado escancaradas nos últimos 15 anos, pelo menos.

Em Bruxelas, o comissário europeu para a Defesa, Andrius Kubilius, disse que a UE está pronta para defender o seu Estado-membro, a Dinamarca, enquanto a diplomata Kaja Kallas disse que os europeus não devem subestimar o seu próprio poder.

Em que consiste este poder de que fala Kallas? A vice-presidente da Comissão Europeia não explicou, mas será talvez útil esclarecer que, sem a NATO, a Europa tem um poder militar que será equivalente ao da Indonésia, e em termos económicos, com a queda industrial da Alemanha, caminha para se constituir como uma potência de segunda divisão. O PIB da União Europeia tem crescido nos últimos anos ao alegre ritmo de 0,1%. Sendo impossível sobrestimar a Europa, será assim também difícil subestimá-la, na medida em que não temos grande margem de manobra para a redução da sua real dimensão.

A histeria relacionada com a Gronelândia subiu de tom depois de terem surgido pormenores de uma chamada telefónica de 45 minutos entre Trump e Frederiksen, durante a qual o regressado inquilino da Casa Branca insistiu no seu desejo de tomar posse da ilha, enquanto Frederiksen teimou que o território não estava à venda. A chamada telefónica foi descrita como “gelada” e “agressiva” pelo New York Times. O Financial Times chamou-lhe “ardente” e “horrível”, citando fontes.

Enquanto isso, os franceses, sempre ansiosos por algum protagonismo no palco internacional, dada a sua contemporânea irrelevância, apostam tudo na fanfarronice, propondo até enviar tropas para Dinamarca.

De facto, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Jean-Noël Barrot, disse que discutiu com Copenhaga o envio de tropas para a Gronelândia em resposta à intenção de Trump de anexar a ilha, embora o governo dinamarquês não tenha apreciado a ideia.

Numa entrevista à Sud Radio Barrot afirmou:

“Começámos a discutir o envio de tropas com a Dinamarca mas os dinamarqueses não desejam avançar com a ideia. Mas se a Dinamarca pedir ajuda, a França estará lá. As fronteiras europeias são soberanas, quer seja a norte, a sul, a leste ou a oeste… ninguém pode permitir-se mexer nas nossas fronteiras”.

Portanto, no caso absurdo dos EUA invadirem militarmente a Gronelândia, a França iria enviar soldados para combaterem as forças americanas. A França é um potência militar capaz desse embate e ninguém sabia disso. Quando não estão a ser corridos de África, os soldados franceses estão sempre à beira de se juntarem aos conflitos mundiais – mas, felizmente para eles, acabam invariavelmente por ficar na caserna.

Também o colégio dos ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia manifestaram o seu “apoio muito forte” a Copenhaga e, segundo Barrot, estariam “prontos a considerar” o envio de tropas, se necessário.

Mas nem todos quiseram entrar nesta guerra. O primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, recusou-se a apoiar a Dinamarca na sua actual disputa com Donald Trump, afirmando:

“Não vou comentar questões que não são centrais para o que tenho de tratar em relação ao Reino Unido e à relação com os EUA.”

A reacção a este lacónico comentário foi de pura fúria da deputada trabalhista e crítica de Starmer, Diane Abbott, que disse que o líder do seu partido está “aterrorizado” com o Presidente dos EUA.

“Starmer tem pavor de Trump e recusa-se a comentar o seu plano de comprar a Gronelândia”.

A rematar, o ministro dinamarquês dos Negócios Estrangeiros, Lars Lokke Rasmussen, prometeu:

“Trump não terá a Gronelândia. A Gronelândia é a Gronelândia. E o povo da Gronelândia é um povo, também no sentido do direito internacional. É também por isso que temos dito repetidamente que, em última análise, é a Gronelândia que decide a situação da Gronelândia”.

Se fosse mais redundante, Rasmussen explodia.

O Contra considera idiota – e até insolente – toda esta iniciativa de Donald Trump em relação à ilha polar. Mas os leninistas-globalistas europeus conseguem ainda assim perder a razão sobre o assunto.

É espantoso.