Trump e a diplomacia da cenoura e do pau. Resultará com Moscovo?

 

 

O Presidente Donald J. Trump expressou a sua consideração pelo povo russo, mas avisou que quer um acordo de paz que termine em breve a “ridícula” guerra na Ucrânia, deixando claro que haverá uma escalada significativa da guerra económica contra a Rússia, a menos que um acordo de paz seja assinado.

Num comunicado publicado na sua plataforma Truth Social, o Presidente afirmou:

“Não estou a tentar prejudicar a Rússia. Eu amo o povo russo e sempre tive um relacionamento muito bom com o presidente Putin – e apesar do ‘embuste da Rússia, Rússia, Rússia’ da esquerda radical. Nunca devemos esquecer que a Rússia nos ajudou a vencer a Segunda Guerra Mundial, perdendo quase 60 milhões de vidas no processo”.

A referência a uma questão sensível relacionada com o orgulho do povo russo, e o seu ressentimento pelo seu papel na Segunda Guerra Mundial não ser devidamente reconhecido no Ocidente, tem um propósito claro de namorar o Kremlnin e a opinião pública no país dos czares, e contrasta vivamente com o discurso de Sebastian Gorka, a escolha de Trump para Director de Contra-Terorismo, que se entreteve a insultar Vladimir Putin e a ofender os russos nos meses antes da tomada de posse.

Talvez influenciado por este tipo de lunáticos que nomeou para o seu executivo, Donald Trump continuou a mensagem propondo o pau onde a cenoura estava pendurada.

“Dito isto, vou fazer um grande FAVOR à Rússia, cuja economia está a falhar, e ao Presidente Putin. Resolvam agora e acabem com esta guerra ridícula! Só vai piorar. Se não chegarmos a um ‘acordo’, e em breve, não tenho outra escolha senão aplicar altos níveis de impostos, tarifas e sanções a tudo o que for vendido pela Rússia aos Estados Unidos e a vários outros países participantes.”

Diplomacia em formato MAGA. É capaz de resultar com Israel, mas com Moscovo, é questionável. E já para não falar das capitulares em ‘favor’ ou da propriedade desse ‘favor’, o Presidente norte-americano mente quando fala do estado da economia russa, sendo que resta sobretudo saber o que é que Trump entende como ‘acordo’ (já lá vamos).

A prosa continua em tom ameaçador, até ao seu término:

“Vamos acabar com esta guerra, que nunca teria começado se eu fosse presidente! Podemos fazê-lo da maneira fácil ou da maneira difícil – e a maneira fácil é sempre melhor. É altura de ‘FAZER UM ACORDO’. NÃO HÁ MAIS VIDAS A PERDER!!!”

 

 

Na verdade, a acção económica de Joe Biden e de outros líderes ocidentais contra a Rússia tem-se revelado ineficaz até agora. As estatísticas comerciais das antigas repúblicas socialistas soviéticas na Ásia Central sugerem fortemente que as exportações para a Rússia estão a ser encaminhadas através delas, e grande parte da energia russa anteriormente vendida à Europa está agora a encontrar novos mercados em países como a China e a Índia (de onde é exportada para a Europa).

 

 

No entanto, a referência de Donald Trump a tarifas e sanções sobre “vários outros países participantes” além da Rússia sugere que ele pode estar a contemplar uma abordagem semelhante à utilizada contra o Irão durante o seu primeiro mandato, com os parceiros comerciais da Rússia, bem como a própria Rússia, a serem visados. Esta estratégia foi altamente eficaz contra o Irão, uma potência regional, ao isolá-la rapidamente a nível internacional, mas será certeira com uma potência mundial?

 

Kremlin responde: De que ‘acordo’ estamos a falar?

O enviado adjunto da Rússia às Nações Unidas respondeu de pronto às ameaças económicas de Donald Trump. Dmitry Polyanskiy disse que o Kremlin precisa de saber o que Trump pensa que um acordo inclui antes de tomar seja que iniciativa for na direcção das negociações.

Polyanskiy afirmou, muito assertivamente, à Reuters:

“Não é apenas a questão de acabar com a guerra. É, antes de mais, a questão de abordar as causas profundas da crise ucraniana. Portanto, temos que ver o que o ‘acordo’ significa no entendimento do presidente Trump. Ele não é responsável pelo que os EUA têm feito na Ucrânia desde 2014, tornando-a ‘anti-Rússia’ e preparando-se para a guerra connosco, mas está no seu poder parar agora essa política maliciosa.”

Se os russos fossem a correr para negociações de paz ou cessar-fogo com os ucranianos, por simples ordem de Donald Trump, poderiam certamente ser questionados sobre a legitimidade da guerra que espoletaram. Salva a questão territorial (a área que os russos agora ocupam na Ucrânia é maior do que aquela que exigiam no tratado de paz que Boris Johnson evitou em 2022), há questões fundamentais para o Kremlin que ainda não estão resolvidas, como a hipotética adesão à NATO pela Ucrânia ou a permanência do regime Zelensky, que Putin nunca aceitará.

Há que considerar ainda que Donald Trump pode muito bem desconfiar que as sanções económicas não vão afectar decisivamente a economia russa, e está a falar para os poderes instituídos em Washington, mostrando que não se coíbe de pressionar o adversário estratégico de estimação do complexo militar e industrial americano.

Não é propriamente xadrez de 4 dimensões, mas também não era de todo mal pensado.