Sequer tentarei disfarçar o contentamento e honra que sinto estreando nas páginas do ContraCultura, ocasião em que devo contar com a prévia tolerância do leitor para eventuais palavras e expressões, pouco usuais, pelo fato de ser eu brasileiro. A origem nestes tristes trópicos não dão excusas, entretanto, para o descuido e desacato à última flor do lácio como fazem alguns, e que emprestam feias tonalidades marrons ao verde e amarelo criado pela Casa de Bragança.
Feita a prévia defesa de minha escrita alienígena, passo diretamente ao tema deste artigo – igualmente focado no Brasil – mas que poderá servir de estímulo ao leitor para que investigue eventuais processos semelhantes, ocorridos em sua terra natal, atentando especialmente para o tempo decorrido desde seu início. Isto será fundamental como régua de nossas especulações sobre a duração da luta que enfrentamos hoje, no Brasil e no mundo.
Embora cuidadosamente escondido sob a capa de “reação contra o fim da escravatura”, a deposição do Império do Brasil em 1889 se deu, principalmente, amparada pela mentalidade positivista – sim, este mesmo, do kamarada Comte – imbuída no então pífio Exército Brasileiro. Em linguagem clara, o golpe de estado teve por objetivo levar o “soldado-cidadão” (novamente Comte) ao poder e livrá-los das rédeas curtas impostas pelo nosso amigo Pedro – por aqueles anos, o Imperador e segundo de sua linhagem.
Talvez nem todos concordem com o pensamento que tenho, considerando o positivismo como feto anômalo e gerado pelo mesmo útero formador das ideias de Karl Marx, Friedrich Engels e tantos outros. A imposição do homem como a medida de todas as coisas, a elevação da técnica sobre a sabedoria e a ridicularização da prudência cristã, aos meus olhos, são gêmeas e, digamos, “iluministas”.
Fermentando neste lodaçal filosófico germinavam as primeiras incursões comunistas por estas bandas, culminando no ano de 1922 quando – por “coincidência” – deu-se a conhecida “Semana de Arte Moderna”, no Rio de Janeiro, e a fundação do primeiro Partido Comunista, no Brasil. Nomes como Tarsila do Amaral (e seu feioso Abaporu), Oswald e Mário de Andrade e tantos outros literatos, teatrólogos e artistas plásticos abririam os caminhos para o solerte gramscismo, consolidado décadas depois por Fernando Henrique Cardoso – sociólogo abertamente adepto das teses de Gramsci e que, nas horas vagas, foi Presidente da República.
Por certo a coisa não se deu em um salto: mesmo na ditadura fascista de Getúlio Vargas o comunismo ganhava espaço, pelas mãos de Luís Carlos Prestes – que teve sua esposa, a judia Olga Benario, entregue a Hitler pelo mesmo Getúlio com quem ele se congraçaria tempos depois.
Prosseguindo em nossa linha do tempo, nos anos 30 e 40 a literatura ocupava-se em criar a persona do “brasileiro típico” que hoje o mundo conhece e crê como verdadeira: um híbrido perfeito entre Macunaíma (o “herói sem caráter” de Mário de Andrade) e Jeca Tatú, o indolente e preguiçoso caipira imaginado por Monteiro Lobato. E uma vez consolidada esta versão – fortemente ajudada pela imposição de hábitos condizentes com a baixeza desta criatura, tais como carnaval, jogo, mulherio deslavado e fobia ao trabalho, tudo isso instilado pelos jornais, revistas e teatros da época – tornou-se uma consequência natural a criação do “Cinema Novo” (“Uma ideia na cabeça e uma câmera nas mãos”, de Gláuber Rocha) nos anos 60 e a propagação exponencial deste ser, digamos que humano, o qual deveria nortear o caráter, comportamentos e gostos de toda uma nação.
Ao final da década de 60 esta estratégia ganhou dois valiosos auxílios: o regime militar pós 1964 – o qual encheu os bolsos das editoras que publicavam livros esquerdistas e fez vistas grossas para a infiltração vermelha no sistema de ensino – e o surgimento do maior fenômeno de comunicação no Brasil, chamado Rede Globo de televisão.
Perguntará o leitor: mas como os militares permitiram isso? E respondo lembrando do parentesco entre o positivismo dos quartéis e o comunismo das universidades.
Já o caso da Rede Globo foi único, tornando-se líder absoluta de audiência (houveram épocas em que o capítulo final de uma novela esvaziou o trânsito das ruas) e formadora inconteste do pensamento brasileiro. Quando Fernando Henrique Cardoso sentou-se na cadeira presidencial em 1994, com seu Antônio Gramsci sob os sovacos, foi fácil obter o acordo do Dr. Roberto Marinho – dono da Globo – já que a mesma detinha gigantescas cotas de patrocínio e verbas federais. Não à toa os mais velhos podem testemunhar que, da virada do século para cá, o teor da programação exibida pela citada emissora mudou radicalmente.
Em grossas e rudes linhas, esta foi a trajetória da contaminação brasileira pelo vírus esquerdo-globalista. Um país jovem como o que habito certamente não conta com sólidas tradições culturais e, muito menos, quaisquer referenciais filosóficos – à exceção de Olavo de Carvalho, o qual ainda esperará décadas até ser compreendido verdadeiramente. Ainda assim, digno de nota é o fato que tudo começou (de fato) ainda nos anos 20 do século passado e, certamente, não serão alguns poucos anos que desmontarão o trabalho solerte de arregimentação, infiltração, sabotagem, contra-informação e mesmo combate, das esquerdas brasileiras, atuantes há cem anos.
Que vocês, europeus e muito mais antigos por sobre a face da terra que nós, relembrem e busquem as razões primeiras, as origens, o germe de tudo o que se passa na terra-mãe da sociedade ocidental.
Caberá aos senhores a prudência de avaliar o quão duradoura será a batalha que temos, bem como estarem preparados – logística e estrategicamente – para uma longa e cansativa guerra cultural.
Kirie eleisom…
WALTER BIANCARDINE
___________
Walter Biancardine foi aluno de Olavo de Carvalho, é analista político, jornalista (Diário Cabofriense, Rede Lagos TV, Rádio Ondas Fm) e blogger; foi funcionário da OEA – Organização dos Estados Americanos.
As opiniões do autor não reflectem necessariamente a posição do ContraCultura.
Relacionados
15 Set 24
Globalismo e Comunismo:
Os dois lados da mesma moeda.
A primeira de três crónicas de Walter Biancardine dedicadas à denúncia da herética cumplicidade corporativa, de inspiração marxista, entre os agentes do capitalismo contemporâneo e o Estado.
13 Set 24
É muito provável que o pior agente do caos sejas tu.
O pior agente da decadência do Ocidente, por incrível que possa parecer, não é o Alexandre de Moraes, nem o Justin Trudeau, nem o Emmanuel Macron, nem qualquer vilão deste género, porque estes estes vilões são tão raros que deveriam até ser irrelevantes.
12 Set 24
Desespero com “notório saber jurídico”: A Democracia Trans.
O regime 'trans' que vigora no Brasil é autoritário, draconiano e musculado como uma ditadura, mas distribui gentilezas e graças, aos sócios do sistema, como se de uma democracia legítima se tratasse. Um protesto de Walter Biancardine.
10 Set 24
Um Presidente sem povo, um povo sem Presidente.
Walter Biancardine sublinha a divisão que foi evidente neste 7 de Setembro: De um lado, Luís Inácio e a sua mafia, desfilando no deserto de Brasília, do outro, em S. Paulo, um milhão de pessoas protestavam contra a tirania.
9 Set 24
EUA: As massas como ratos de laboratório.
As elites progressistas da América são os investigadores geniais de bata branca, enquanto as massas constituem os seus ratos de laboratório, dispensáveis e necessariamente sacrificados em função dos amanhãs que cantam.
8 Set 24
Dia da Independência: Todo o poder emana do povo.
Walter Biancardine sublinha que, no Dia da Independência do Brasil, o povo foi às ruas exigir a liberdade. Um sintoma da anomia institucional que envolve a nação e que, num sinal de alerta enviado ao mundo, denuncia a vigência real de uma ditadura.