Um vídeo alarmante que se tornou viral ontem nas redes sociais mostra o deputado Jamie Raskin (D-Md.) a afirmar que o Congresso terá que desqualificar o ex-presidente Donald Trump a 6 de janeiro de 2025, se ele vencer a eleição de Novembro, enquanto previa uma guerra civil com “turbas de Trump em fúria”, depois de anulados os resultados eleitorais.

Raskin fez os comentários perturbadores durante uma discussão sobre os direitos dos eleitores com o professor de direito Richard L. Hasen e a advogada de direitos civis Sherrilyn Iffil, na livraria Politics and Prose, em Washington D.C., a 17 de Fevereiro de 2024. As declarações do congressista foram tão extremas que alguns se interrogam se o vídeo terá sido manipulado, embora tudo indique que não será esse o caso.

Na altura em que foram proferidas as declarações em causa, esperava-se que o Supremo Tribunal decidisse a favor de Trump num caso em que o candidato republicano tinha sido retirado dos boletins de voto das primárias do Partido Republicano, no Colorado. Os democratas argumentaram que Trump deveria ser expulso dos boletins de voto devido a uma disposição da 14ª Emenda relativa a pessoas que se envolvem em insurreições.

Raskin lamentou o facto do Supremo Tribunal de Justiça parecer estar pronto para decidir contra a posição dos democratas sobre a questão, afirmando:

“O maior exemplo do que está a acontecer neste momento, perante os nossos olhos, é a Secção 3 da Décima Quarta Emenda, que está a desaparecer com uma varinha mágica, como se não existisse, apesar de não poder ser mais claro o que diz”.

O Supremo acabou por decidir, num uníssono de 9-0, que

“Os Estados não têm poder, ao abrigo da Constituição, para aplicar a Secção 3 no que diz respeito aos cargos federais, especialmente a Presidência. Uma vez que a Constituição torna o Congresso, e não os Estados, responsável pela aplicação da Secção 3 contra os titulares de cargos e candidatos federais, invertemos a decisão [do Colorado]”.

Trump foi assim reintegrado nos boletins de voto do Colorado após a decisão unânime.

Raskin parecia confiante de que os democratas conseguiriam maiorias sólidas em ambas as câmaras do Congresso nas eleições de Novembro, permitindo-lhes aprovar legislação que desqualificava Trump.

O democrata de Maryland disse aos seus camaradas:

“Vai caber-nos a nós, a 6 de janeiro de 2025, dizer às turbas desenfreadas de Trump que ele está desqualificado”.

Raskin previu que a desordem civil se seguiria após a recusa de Trump à presidência:

“E então precisaremos de guarda-costas para todos e condições de guerra civil, tudo porque os nove juízes simplesmente não querem fazer obseu trabalho e interpretar o que a 14ª Emenda significa.”

 

 

Raskin continuou depois a atacar o Supremo Tribunal, num chorrilho de disparates que parecem apelar claramente a um processo revolucionário que transcenda a autoridade do supremo e os fundamentos da Constituição americana:

 “O direito de voto está a ser atacado de formas muito específicas em muitos estados, especialmente em alguns dos estados do Sul profundo, especialmente na Florida, de onde acabei de regressar. Estão a acontecer coisas inacreditáveis – por exemplo, se tiver de enviar um boletim de voto pelo correio ou um boletim de voto por correspondência, só pode ser levado à caixa do correio ou às urnas por um membro da sua família nuclear que viva consigo. Portanto, há um milhão de armadilhas para os incautos que estão a ser montadas em todo o país.

Mas, ao mesmo tempo, temos de nos empenhar na articulação de um direito constitucional de voto que seja significativo para toda a gente no país. Os milhões de pessoas que são deixadas de fora e privadas de direitos, e para todos aqueles cujo direito de voto é tornado vulnerável por este Supremo Tribunal, que tem sido esmagadoramente reacionário ou conservador, quero dizer, até à Guerra Civil, o que é que o Supremo Tribunal alguma vez fez pelas pessoas escravizadas no nosso país? Absolutamente nada, para além de cimentar o seu estatuto na decisão Dred Scott, dizendo que os afro-americanos não tinham direitos que o homem branco fosse obrigado a respeitar. E depois, mesmo após a Guerra Civil, mesmo após as emendas da Reconstrução, em 1896, em Plessy v. Ferguson, constitucionalizando Jim Crow.

E só depois do Tribunal Warren, durante algumas décadas, com os casos das primárias brancas e Brown v. Board, é que se consegue um tipo diferente de Supremo Tribunal do lado das liberdades e da igualdade do povo americano. Mas o tribunal não nos vai salvar. E isso significa que a única coisa que realmente funciona são as pessoas em movimento que alteram a Constituição – mas, mais uma vez, é necessário, mas não é suficiente, porque o que pode ser colocado na Constituição pode escapar-nos muito rapidamente.”

O representante Chip Roy (R-Texas) reagiu às palavras intempestivas de Raskin depois do vídeo se ter tornado viral nas redes sociais, afirmando:

“Raskin está 1) a conceder a eleição… 2) a fomentar a guerra civil… 3) a ameaçar desafiar a vontade dos eleitores… 4) a assumir que o Congresso estará disposto a aprovar esta medida…”

O antigo congressista Lee Zelden (R-NY), escreveu:

“Mesmo que os eleitores elejam inquestionavelmente Donald Trump como presidente, independentemente da margem, e mesmo que a eleição seja universalmente aceite como livre e justa, os democratas estão a pedir ao Congresso que bloqueie a certificação dos resultados e se prepare para a guerra civil”.

O antigo conselheiro de Trump e fundador da America First Legal, Stephen Miller, afirmou a este propósito:

“Creio que a isto se chama uma conspiração criminosa para cometer interferência eleitoral.”

Alguns jornalistas questionaram se os comentários extraordinários de Raskin eram legítimos ou uma farsa. Matt Taibbi sublinhou a necessidade de Raskin confirmar ou desmentir estas declarações:

“Acho que o gabinete de Jamie Raskin tem de comentar a veracidade de um vídeo que está a circular. Se for de alguma forma alterado, ele precisa de fazer uma declaração forte nesse sentido”.

O biólogo evolucionista e apresentador do podcast Dark Horse, Bret Weinstein, afirmou:

“É difícil acreditar que Jamie Raskin defenda algum tipo de insurreição do Congresso contra a nossa República democrática, mas aqui está ele a dizê-lo em vídeo. Há alguma hipótese de ser uma falsificação?”

Os comentários de Raskin não são porém tão surpreendentes assim. Como o ContraCultura noticiou em Março deste ano, vários congressistas democratas, que passaram os últimos três anos a acusar Trump e muitos dos seus aliados de negação dos resultados das eleições de 2020 e de insurreição regimental, já afirmaram publicamente que se recusarão a certificar uma potencial vitória do candidato republicano nas presidenciais de Novembro de 2024.

Por outro lado, uma sondagem da Rasmussen revelou que dois terços dos democratas americanos acham que uma eventual vitória de Trump nas eleições de Novembro não deve ser certificada pelo Congresso.

Em certo sentido – o profético – Jamie Raskin até está carregado de razão: Os EUA são uma guerra civil à espera de acontecer.

Ou melhor: a guerra civil está a decorrer desde que Barak Obama foi eleito. Os republicanos é que ainda não deram por isso.