A psicologia do homem moderno revela uma imagem marcada pela mediocridade e pela sensação de carência, seja ela afetiva, material ou, como destacarei aqui, de direitos. Se pudéssemos examinar a mente humana por meio de uma tomografia cerebral, certamente encontraríamos um tumor insidioso chamado direito. Esse tumor tem corroído os alicerces da sociedade como um todo, alimentando uma geração mimada que falha em compreender que direitos são, na verdade, os deveres de outrem, e que os exigir sem considerar os deveres correspondentes é um equívoco fatal.

A cada dia, ouvimos clamores por direitos, por expansões, como se fossem concessões arbitradas pelo cosmos. No entanto, é vital lembrar que os direitos nascem e perecem dentro do âmbito legal, e sua eficácia está intrinsecamente ligada à sua consonância com os deveres. A arrogância humana e a busca incessante por direitos sem limites nos conduzem a um retrocesso existencial e, potencialmente, ao colapso moral e sustentável de nossa sociedade. Afinal, grande parte de nossa evolução como espécie foi impulsionada pela lei natural dos deveres, não dos direitos.

A glorificação dessa cultura de exigências exacerbadas não apenas a incentiva, mas também a legitima. Reconhecer que, por natureza, tendemos a priorizar nosso próprio bem-estar e prazer é uma constatação válida, mas definir essas tendências como limites intransponíveis é renunciar à própria essência da racionalidade. Somos capazes de transcender esses impulsos egoístas em prol do bem comum e da responsabilidade coletiva ou nos resignaremos ao comodismo de uma existência egoísta?

O medo do desconhecido e a incompreensão do futuro incerto podem nos levar a uma ilusão reconfortante, na qual depositamos fé cega em um sistema que promete garantir nossos direitos, terceirizando a efetividade de conceitos fundamentais como amor, prosperidade, sucesso, pertença e felicidade. Essa mentalidade narcisista e hedonista, que se recusa a reconhecer as responsabilidades que acompanham nossas demandas por direitos, revela uma incapacidade coletiva de compreender que o mundo não nos deve nada.

É fácil exigir direitos sem considerar as implicações e obrigações que acompanham essa demanda. No entanto, uma verdadeira autonomia só pode ser alcançada quando estamos dispostos a assumir as consequências de nossas ações e a contribuir ativamente para o bem-estar coletivo e sobretudo para o nosso crescimento pessoal.

Ao invés de esperar que a sociedade nos conceda algo, devemos nos perguntar o que podemos conceder a ela. Como podemos fazer a diferença no mundo ao nosso redor? Ao adotarmos uma mentalidade de humildade e serviço, sabendo se posicionar em relação a quem você é, podemos nos libertar da expectativa de que os outros nos devem algo e encontrar uma verdadeira realização ao fazer a diferença na vida das pessoas e na comunidade em geral. Este é o chamado inequívoco que direciona nossa ânsia por viver, saber que algo que surja de sua individualidade pode afetar para melhor a individualidade alheia ou até mesmo, em grande escala, o coletivo.

Em última análise, como bem observou G.K. Chesterton, grande parte da liberdade moderna tem suas raízes no medo – não porque sejamos demasiado fortes para suportar regras, mas porque somos demasiado fracos para suportar responsabilidades. É hora de abandonar a ilusão de que o mundo nos deve algo e assumir plenamente a responsabilidade por nossas ações e pelo futuro de nossa sociedade. Somente assim poderemos alcançar uma verdadeira liberdade e um senso de realização que tenha sentido, que não nos faça eternamente crianças mimadas incapazes de assumir o próprio espaço.

 

PAULO H. SANTOS
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Paulo H. Santos é professor particular de filosofia, bacharel em filosofia (UCP – Brasil) e licenciado em História (UNESA – Brasil). Católico. Escreve em português do Brasil
As opiniões do autor não reflectem necessariamente a posição do ContraCultura.