Uma análise meticulosa de centenas de trabalhos de investigação sobre energias renováveis, publicada em 2022, questiona os impactos ambientais e a viabilidade da transição para as “energias verdes”, concluindo que não existe algo a que se possa chamar “energia limpa”.

Um detalhado e exaustivo estudo publicado na revista científica Energies, realizado por uma equipa de investigadores irlandeses e norte-americanos, incluindo investigadores do CERES, levanta questões surpreendentes e inquietantes sobre a viabilidade e os impactos ambientais da transição para as fontes de energia renováveis. A preocupação com as alterações climáticas levou a um investimento massivo em novas políticas de “energia verde” destinadas a reduzir as emissões de gases com efeito de estufa (GEE) e outros impactos ambientais da indústria dos combustíveis fósseis. No período de oito anos entre 2011 e 2018, o mundo gastou 3,6 biliões de dólares em projectos relacionados com as alterações climáticas. Um total de 55% deste montante foi gasto em energia solar e eólica, enquanto apenas 5% foi gasto na adaptação aos impactos de fenómenos meteorológicos extremos.

 

DESPESAS GLOBAIS COM AS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS . 2011 – 2018

 

Impactos ambientais surpreendentes.

Os investigadores descobriram que os sistemas de energia renovável agravam por vezes os problemas que foram concebidos para resolver. Por exemplo, uma série de estudos internacionais revelou que tanto os parques eólicos como os solares estão a provocar alterações climáticas locais. Os parques eólicos aumentam a temperatura do solo por baixo deles, e este aquecimento faz com que os micróbios do solo libertem mais dióxido de carbono. Assim, ironicamente, embora a energia eólica possa estar a reduzir parcialmente as “emissões de carbono” humanas, está também a aumentar as “emissões de carbono” de fontes naturais.

A geração de energia eólica deve considerar também factores como o “efeito de esteira“, que gera uma queda na velocidade do vento, além do aumento de turbulência. Esse efeito é gerado pela passagem do ar pela turbina e, dessa forma, as turbinas a jusante do fluxo de vento são afectadas. A esteira não apenas gera esforços adicionais na estrutura, como também provoca uma redução na eficiência na produção de energia. Os cálculos de produção e rentabilidade dos parques eólicos não têm em conta, na generalidade dos casos, esse factor, que na verdade agrava a sua já questionável eficiência.

 

Fotografias que ilustra o “efeito de esteira” em parques eólicos off-shore ao largo da costa da Dinamarca. Bel Air Aviation Denmark – Helicopter Services (2017). Creative Commons

 

Por outro lado, o impacto dos parques eólicos na vida animal é também preocupante. Um estudo publicado no Journal of Animal Ecology, demonstra que o impacto da produção de energia eólica na vida selvagem pode ser maior do que se pensava, já que uma área com cerca de 650m a 700m de raio à volta de cada turbina é espaço de voo perdido para as aves planadoras. Mais: Estima-se que os parques eólicos sejam responsáveis pela morte de 5 milhões de aves por ano.

Os parques solares e eólicos também necessitam de 100 vezes mais área de terra do que a electricidade gerada por combustíveis fósseis, e estas alterações resultantes na utilização do solo podem ter um efeito devastador na biodiversidade. Por outro lado, os efeitos da bioenergia na biodiversidade são dramáticos e a utilização crescente de culturas como o óleo de palma para a produção de biocombustíveis já está a contribuir para a destruição das florestas tropicais e de outros habitats naturais.

As tecnologias de energia verde requerem que a extracção de minerais seja aumentada dez vezes em comparação com a eletricidade produzida a partir de combustíveis fósseis. Da mesma forma, a substituição de apenas 50 milhões dos 1,3 mil milhões de veículos que constituem o parque automóvel mundial por veículos eléctricos exigiria mais do que a duplicação da produção anual mundial de cobalto, neodímio e lítio, e a utilização de mais de metade da actual produção anual de cobre.

 

Implicações financeiras desconcertantes.

Surpreendentemente, mais de metade (55%) de toda a despesa global com o clima nos anos 2011-2018 foi gasta em energia solar e eólica – um total de 2 biliões de dólares. Apesar disso, as energias eólica e solar produziram apenas 3% do consumo mundial de energia em 2018, enquanto os combustíveis fósseis (petróleo, carvão e gás) produziram 85%. Isto levanta questões prementes sobre quanto custaria fazer a transição para energias 100% renováveis, como sugerem alguns investigadores.

O autor principal da análise, Coilín ÓhAiseadha, afirma:

“O aumento da percentagem de energia produzida por energia solar e eólica de meio por cento para três por cento, custou ao mundo 2 biliões de dólares e foram necessários oito anos para o fazer. Quanto custaria aumentar essa percentagem para 100%? E quanto tempo é que isso demoraria?”

 

CONSUMO MUNDIAL DE ENERGIA . 2018

 

Assustadores desafios de engenharia.

Os engenheiros sempre souberam que os grandes parques solares e eólicos são afectados pelo chamado “problema da intermitência“. Ao contrário das fontes convencionais de produção de electricidade, que fornecem energia contínua e fiável 24 horas por dia, 7 dias por semana, os parques eólicos e solares só produzem eletricidade quando há vento ou luz solar.

O Dr. Ronan Connolly, coautor desta análise, afirma:

“O agregado familiar médio espera que os seus frigoríficos e congeladores funcionem continuamente e que possam ligar e desligar as luzes a pedido. Os promotores da energia eólica e solar têm de começar a admitir que não são capazes de fornecer este tipo de electricidade contínua e a pedido, à escala nacional, a que as sociedades modernas estão habituadas”.

O problema não é facilmente resolvido através do armazenamento de baterias em grande escala, porque isso exigiria baterias enormes que cobririam muitos hectares de terra. A Tesla construiu uma grande bateria para estabilizar a rede no Sul da Austrália. Tem uma capacidade de 100 MW/129 MWh e cobre um hectare de terreno. Um dos artigos analisados neste novo estudo estimou que, se o estado de Alberta, no Canadá, mudasse do carvão para as energias renováveis, utilizando o gás natural e o armazenamento em baterias como apoio, seriam necessárias 100 destas grandes baterias para satisfazer os picos de procura.

Alguns investigadores sugeriram que as variações na produção de energia podem ser compensadas através da construção de redes continentais de transporte de eletricidade, por exemplo, uma rede que ligue os parques eólicos no noroeste da Europa aos parques solares no sudeste, mas isso exige um investimento massivo. É provável que crie estrangulamentos nos casos em que a capacidade das interconexões seja insuficiente e não elimina a vulnerabilidade subjacente às falhas do sol e do vento, que podem durar dias a fio.

 

Prejudicar os mais pobres.

Uma série de estudos realizados na Europa, nos Estados Unidos e na China mostra que os impostos sobre o carbono tendem a sobrecarregar mais as famílias mais pobres e os habitantes das zonas rurais.

Embora a principal motivação para as políticas de energia verde seja a preocupação com as alterações climáticas, apenas 5% das despesas com o clima foram dedicadas à adaptação climática. A adaptação às alterações climáticas inclui a ajuda aos países em desenvolvimento, de forma a que respondam melhor a fenómenos meteorológicos extremos, como os furacões. A necessidade de construir infra-estruturas de adaptação às alterações climáticas e sistemas de resposta a emergências pode entrar em conflito com a necessidade de reduzir as emissões de gases com efeito de estufa, porque os combustíveis fósseis são geralmente a fonte de energia barata mais facilmente disponível para o desenvolvimento.

No que diz respeito às populações indígenas, a análise salienta o facto de todas as tecnologias energéticas poderem ter impactos graves nas comunidades locais, sobretudo se estas não forem devidamente consultadas. A extracção de cobalto, necessária para fabricar baterias para veículos eléctricos, tem graves impactos na saúde das mulheres e das crianças das comunidades mineiras, onde a actividade extractiva é frequentemente relaizada em minas não regulamentadas, de pequena escala e “artesanais”. A extracção de lítio, também necessária para o fabrico de baterias para veículos eléctricos, requer grandes quantidades de água e pode causar poluição e escassez de água doce para as comunidades locais.

Como refere o autor principal do estudo, Coilín ÓhAiseadha:

“Houve cobertura mundial do conflito entre a tribo Sioux de Standing Rock e o oleoduto Dakota Access, mas o que dizer dos impactos da extracção de cobalto nos povos indígenas da República Democrática do Congo e dos impactos da extracção de lítio nos povos do deserto de Atacama? Lembram-se da palavra de ordem que entoaram em Standing Rock? Mni Wiconi! Água é vida! Bem, isso aplica-se quer sejamos os Sioux de Standing Rock preocupados com um derrame de petróleo que polui o rio, quer estejamos no deserto de Atacama preocupados com a extraçcão de lítio que polui as nossas águas subterrâneas”.

Acresce que muitas destas minas operam com veículos pesados movidos a motores de combustão interna e máquinas alimentadas a gasóleo. Versões destes equipamentos industriais de alimentação eléctrica ainda nem sequer existem no mercado.

 

Resumo do artigo.

A análise, que conclui que as energias renováveis também são poluentes e que a energia “limpa” é um mito, foi publicada numa edição especial da revista Energies, a 16 de Setembro de 2022, tem 39 páginas, que descrevem a repartição das despesas com as alterações climáticas e os prós e contras das várias opções: eólica, solar, hídrica, nuclear, combustíveis fósseis, bioenergia, marés e geotérmica.

Para a revisão, os investigadores fizeram uma pesquisa meticulosa de centenas de artigos de investigação publicados em todo o mundo anglófono, numa vasta gama de domínios, incluindo engenharia, ambiente, energia e política climática. O relatório final inclui referências a 255 trabalhos de investigação que abrangem todos estes domínios e termina com um quadro que resume os prós e os contras de todas as várias tecnologias energéticas (em baixo). Os membros da equipa de investigação estavam sediados na República da Irlanda, na Irlanda do Norte e nos Estados Unidos.

 

 

A análise foi publicada como um artigo de revisão por pares de acesso livre e pode ser descarregada gratuitamente aqui.