Vários peritos que analisaram as imagens de vídeo e áudio encontraram grandes inconsistências na afirmação de Israel de que os militantes palestinianos foram responsáveis pelo bombardeamento mortal do Hospital al-Ahli em Gaza, na semana passada
As alegações são da Earshot, uma ONG especializada na análise áudio de imagens de zonas de conflito e de casos de direitos humanos, da Forensic Architecture, uma agência de investigação sediada na Universidade de Londres e de vários trabalhos jornalísticos.
O hospital de gestão cristã, também conhecido como Hospital Batista, foi destruído por uma explosão na terça-feira passada. Cerca de 500 pessoas morreram na explosão, segundo o Ministério da Saúde palestiniano.
As autoridades israelitas divulgaram um vídeo e um pista áudio que alegadamente provaria que o edifício foi atingido por um foguete palestiniano. O vídeo mostra uma salva de foguetes palestinianos a voar de leste para oeste, com um deles a explodir sobre o hospital. A “prova” áudio consiste numa chamada telefónica interceptada em que militantes do Hamas alegadamente discutem a forma como os foguetes disparados pelo grupo Jihad Islâmica tinham falhado e caído em Gaza.
For those of you still questioning what happened at the al-Ahli Hospital in #Gaza last night, we have receipts.
Watch: pic.twitter.com/n7yN68WyAv
— Israel ישראל 🇮🇱 (@Israel) October 18, 2023
O primiero-ministro israelita Benjamin Netanyahu escreveu nas redes sociais, na terça-feira à noite:
“O mundo inteiro deve saber: Foram os terroristas bárbaros de Gaza que atacaram o hospital de Gaza, e não as Forças de Defesa de Israel.”
No entanto, as equipas da Al Jazeera, do Qatar, e da rede britânica Channel 4 estudaram o vídeo e concluíram que o clarão não podia estar relacionado com a subsequente explosão no hospital. A Al Jazeera observou que o clarão
“era de facto consistente com o sistema de defesa antimíssil Iron Dome de Israel a intercetar um míssil disparado da Faixa de Gaza e a destruí-lo em pleno ar”.
Who was behind the Gaza hospital blast – a visual investigation. pic.twitter.com/FGQ9kG0Wni
— Channel 4 News (@Channel4News) October 19, 2023
Podemos perfeitamente argumentar que estes dois órgãos noticiosos são parciais (pró-Hamas). Mas na conta do Twitter/X Citizen Journalists, que prima pela independência, também encontramos vários indícios de que a responsabilidade da explosão cabe ao fogo israelita.
Having spent 2 days looking at all the ‘OSINT’ accounts none can explain this video and I will tell you why. Sometimes in life you just have to rely on your eyes and ear.
This is a missile that is locked onto a target & headed straight for it. This is what hit the hospital. pic.twitter.com/q0wAyfOISq
— Citizen Journalists (@citizenjournos_) October 19, 2023
Num segundo vídeo filmado perto do local da explosão, pode ouvir-se um foguete ou míssil a aproximar-se e a guinchar no ar antes de embater no hospital. A Earshot estudou este vídeo e descobriu que a frequência do projéctil indica que “se aproximou do hospital de nordeste, leste ou sudeste”, enquanto Israel afirma que se aproximou de oeste.
On the morning of October 18th, Israel Defence Forces released this video https://t.co/0edVN249Nr. https://t.co/8gAKfOuJj7 performed an audio analysis and found that this recording was manipulated and cannot be used as a credible source of evidence. 1/4
— earshot.ngo (@earshot_ngo) October 20, 2023
A Earshot também estudou a gravação telefónica e descobriu que, ao contrário da maioria das chamadas, em que as vozes de ambas as partes são transmitidas no mesmo canal de áudio, a gravação consiste em duas vozes gravadas separadamente e posteriormente acopladas. Embora a Earshot tenha afirmado que não pode afirmar categoricamente que o diálogo é falso, o nível de manipulação necessário para editar estas duas vozes em conjunto desqualifica-o como fonte de prova credível.
A Forensic Architecture corroborou as conclusões da Earshot, afirmando que o projéctil veio provavelmente da direção de Israel. Uma análise mais aprofundada da cratera deixada no hospital apontou para uma aproximação de nordeste.
3D analysis shows patterns of radial fragmentation on the southwest side of the impact crater, as well as a shallow channel leading into the crater from the northeast. Such patterns indicate a likely projectile trajectory with northeast origins. pic.twitter.com/v6g6jRiXps
— Forensic Architecture (@ForensicArchi) October 20, 2023
Mas, ironicamente, talvez a mais concludente evidência de que foi Israel que bombardeou o hospital vem das próprias fontes sionistas. Imediatamente após a explosão, o conselheiro do governo israelita Hananya Naftali escreveu isto no X:
“A Força Aérea israelita atingiu uma base terrorista do Hamas dentro de um hospital em Gaza. Uma multiplicidade de terroristas estão mortos.”
O tweet foi apagado minutos depois. Mas a Web é um território danado:
🇮🇱🇵🇸 Netanyahu-appointed Israeli Digital Spokesperson @HananyaNaftali just posted, then DELETED, a tweet admitting that Israel bombed the Baptist Hospital in Gaza, killing 500 civilians.
Only problem? Naftali reported that the IDF thought they hit a “terrorist base.”
Whoops. pic.twitter.com/PIa1vqVqIv
— Jackson Hinkle 🇺🇸 (@jacksonhinklle) October 17, 2023
Ainda assim, o Presidente dos EUA, Joe Biden, apoiou a versão israelita dos acontecimentos (apesar de estar a ser pressionado pelo Congresso para tornar públicas as evidências que conduziram a essa decisão), e o que não faltam são adeptos do sionismo que continuam a insistir na narrativa, agora evidentemente falsa, de que foram os jihadistas que rebentaram com 500 infelizes.
Os que insistem na patranha de que Israel destruiu um hospital (na verdade um parque de estacionamento) e matou 500 pessoas (talvez uma dúzia, vítimas de fogo “amigo”) têm avença com o Hamas ou difundem propaganda terrorista por vocação?
— alberto gonçalves (@albertogonc) October 18, 2023
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