“Rock And Roll Ain’t Noise Pollution.”
Malcolm Young

 

25 de Julho de 1980. Cinco breves meses depois da morte por “intoxicação alcoólica aguda” do seu icónico e selvagem vocalista, Bon Scott, com quem tinham gravado a generosa quantidade de 6 discos, os australianos AC/DC regressam de luto, com aquela que é, na mendiga opinião do redactor deste texto, a sua obra primeira e um monumento megalítico na história do Rock: “Back in Black” é um prodígio de virtuosismo e de energia, raro e electrizante fogo de Santo Anselmo e testemunho da afirmação, logo nos primeiros minutos do disco, de um outro icónico e selvático vocalista, Brian Johnson.

 

 

Este é o disco de rock mais vendido de todos os tempos e encontra-se numa muito mais que honrosa segunda posição na lista dos álbuns mais vendidos da história da indústria discográfica, tendo sido suplantado apenas por “Thriller”, de Michael Jackson. O álbum já vendeu mais de 22 milhões de cópias só nos Estados Unidos.

Depois do sucesso de “Highway to Hell”, a banda começou imediatamente a desenvolver música para um novo trabalho de estúdio, mas depois da morte de Scott e do recrutamento de Johnson, o projecto foi totalmente refeito, integrando pedradas que não estavam no line up inicial como “Hells Bells”, “You Shook Me All Night Long” e, obviamente, a faixa que dá título ao álbum. Nenhuma das letras escritas por Scott foram utilizadas, pois o grupo não queria lucrar com a sua morte. Apesar disso, o vocalista defunto, que começou a sua carreira como baterista nos The Spektors, ainda deixou a sua marca neste disco, já que as pistas de percussão de “Let Me Put My Love into You” e “”Have a Drink on Me” foram tocadas por ele.

 

 

“Back In Black” foi gravado entre Abril e Maio de 1980 em Compass Point, nas Bahamas, sob a lendária batuta do produtor “Mutt” Lange (que também produziu trabalhos de outros monstros do rock como Def Leppard, Foreigner, The Cars, Bryan Adams, Huey Lewis and the News, e etc.). À chegada da banda, a região estava a ser atingida por várias tempestades tropicais, causando estragos no sistema eléctrico do estúdio. Também por isso, o equipamento da banda ficou retido num contentor na Austrália e só chegou muitos dias depois das gravações se terem iniciado. Johnson relatou ter tido dificuldades de adaptação ao ambiente opressivo do estúdio (um labirinto de células de cimento) e às condições climatéricas, e até referiu o mau tempo nas linhas de abertura de “Hells Bells”:

“I’m rolling thunder, pourin’ rain.
I’m comin’ on like a hurricane.
My lightning’s flashing across the sky.
You’re only young but you’re gonna die.”

 

 

Apesar disso, “Mutt” Lange focou particular atenção na performance do vocalista recém chegado à banda, exigindo a perfeição de cada take.

“O Mutt não deixava passar nada. Tudo tinha que ser perfeito. Ele  queria que as pessoas ouvissem o álbum e pensassem que não havia maneira de alguém poder cantar assim. Mesmo a respiração tinha de estar no sítio certo. Não se pode criticar um produtor por isso, mas ele levou-me à loucura. Às tantas eu ficava para ali sentado ofegante e exausto.”
Brian Johnson

As dificuldades técnicas, logísticas e ambientais acabaram por ser superadas e ainda durante o processo de gravação músicos e engenheiros estavam muito optimistas sobre a qualidade final do trabalho. À procura da cereja para colocar em cima do bolo, a banda solicitou ao manager Ian Jeffery que encontrasse um sino para incluir algumas badaladas em “Hells Bells”.  Jeffery localizou uma fundição para produzir o sino, mas depois de sete semanas passadas sem resultados materiais, sugeriu que os engenheiros gravassem os sinos numa igreja próxima. Estas gravações não foram porém satisfatórias devido ao som dos bandos de pássaros que levantavam voo, assustados, a cada toque de sino. A fundição acabou por conseguir produzir o sino em tempo útil, que foi perfeitamente afinado e gravado com um estúdio móvel. Após a conclusão da gravação, o grupo misturou Back in Black no Electric Lady Studios, em Nova Iorque.

 

 

Segundo Angus Young, a capa do disco foi pensada para ser totalmente negra, com a letra em relevo cunhado, como um sinal de luto pela morte de Scott. A Atlantic Records discordou inicialmente, dada a pouca visibilidade do nome da banda, mas acabou por aceitar o compromisso que se colocasse um contorno cinzento à volta do logótipo.

 

 

Para a história ficou um disco eterno. A estridência eufórica e simultaneamente enlutada destes dez temas, que vão ecoar sobre a posteridade como batalhas alexandrinas, é difícil de colocar em palavras sem sucumbir à tentação do exagero (porque este disco é um exagero de muitas coisas boas); e de qualquer forma toda a gente sabe do que estamos a falar quando falamos de “Back In Black” e todos os adjectivos são redundantes e silenciados pela electricidade melódica, pela veemência estilística, desta banda divina.

O melhor que podemos fazer é revisitar “Back in Black”, de vez em quando. Nem que seja porque esta, sendo uma obra ao negro, consegue o paradoxo de elevar a mais soturna das disposições.