A mudança de estratégia do Kremlin e a intensificação do envolvimento das forças ocidentais na Ucrânia poderá conduzir a uma guerra permanente na Europa.
Putin está a introduzir alterações significativas na abordagem russa, à medida que a guerra cumpre o seu primeiro ano de cinzas. Na semana passada, a Rússia anunciou que fará “grandes mudanças” para reforçar as suas forças armadas durante o período 2023-2026, um sinal de que Moscovo está a reformular a sua estratégia, que está agora centrada no combate em larga escala em vez de uma “operação militar especial”.
A Rússia e a NATO qualificam-se mutuamente como inimigos declarados. A actual Estratégia de Segurança Nacional de Biden descreve a Rússia como uma “ameaça imediata”. A doutrina militar pós-soviética da Rússia codificou a Aliança Atlântica como o “perigo primeiro”.
A Ucrânia é o estado tampão, mártir, deste duelo, que tem impedido um conflito directo entre as potências nucleares. Trocar territórios por sangue para proteger o coração da nação é a essência desta abordagem. É por isso que a questão do controlo sobre a Ucrânia, onde o equilíbrio de poder na Eurásia é frequentemente disputado pelo correr da história, é uma ferida que só tem vindo a infectar desde o colapso da União Soviética.
Tendo ganho a Guerra Fria, os EUA têm vindo a incorporar a Ucrânia na órbita ocidental, muito por influência directa da CIA nas convulsões políticas que abalaram o país nas últimas décadas. Essa “incorporação” permitiu a americanos e europeus reduzir o aparelho de dissuasão militar na Europa. Enquanto os ucranianos, entre civis e militares, já perderam para cima de 50.000 almas nesta guerra, a maioria dos países da NATO, 22 de 30, não contribuem sequer com 2% do PIB para a defesa comum.
Por outro lado, Washington vê o constante e bilionário reforço militar e tecnológico da Ucrânia como um bom investimento; primeiro porque alimenta esplendidamente o seu complexo industrial e militar que é uma das principais máquinas de poder e de dinheiro e de extermínio na história universal da infâmia, e depois porque calcula que assim irá sangrar os recursos militares e logísticos russos.
Russian Foreign Ministry spokeswoman, Maria Zakharova said on Friday that the statements about supplying Ukraine with any weapons, including those that are able to hit Crimea will “inevitably” lead to “an escalation”. pic.twitter.com/FNB6vlyO2w
— Newzy (@TheRealNewzy) January 24, 2023
Mas a Rússia, que foi invadida três vezes nos últimos 200 anos; que nos últimos 500 anos e só contando com os inimigos ocidentais, foi invadida por polacos (1605), suecos (1708), franceses (1812), franceses, ingleses e turcos (1853), e pelos alemães em 1914 e 1941; a Rússia que, em média, combateu na planície do norte da Europa uma vez em cada 33 anos e que viu a sua zona tampão com a NATO reduzida a apenas 100 milhas, após a adesão ao Tratado do Atlântico Norte pelos Estados Bálticos em 2004, traçou uma linha vermelha sobre a Ucrânia.
Moscovo vê a expansão da NATO na Ucrânia como os americanos viram a instalação de misseis em Cuba pelo Pacto de Varsóvia. O resultado desta guerra é de categoria existencial para Putin, que está determinado a manter a Ucrânia afastada da NATO. Se essa determinação irá até à destruição total do país, ou ao ponto sem retorno de um confronto directo com uma ampla coligação ocidental, que seria muito provavelmente de carácter apocalítico, são variáveis que estão por definir.
Por esta altura, Putin deve estar a confirmar o seu pior receio: o de ter que travar uma guerra com a NATO. A chegada de tropas ucranianas a Oklahoma para treino e formação no sistema de defesa anti-mísseis Patriot e o compromisso do Pentágono de fornecer 50 veículos de combate Bradley a Kyiv está a levar o conflito a um novo nível. E o Kremlin contrapõe com uma nova estratégia de guerra total, desenvolvida de com base em protocolos estratégicos concebidos para um confronto directo com a Aliança Atlântica há cerca de uma década.
Em antecipação de uma retaliação da Ucrânia, e possivelmente da NATO, ao aumento da intensidade e da actividade das forças militares russas no teatro de operações, Putin está a fortificar Moscovo. Sistemas antiaéreos Pantsir foram alegadamente instalados em vários telhados no centro da cidade, incluindo o Kremlin, o Ministério da Defesa, e a residência Valdai de Putin, na região de Novgorod. Os sistemas foram colocados em alerta de combate.
A 22 de Dezembro, Putin, pela primeira vez, referiu-se ao conflito na Ucrânia como uma guerra, em vez de uma “operação militar especial”. Combater uma guerra em grande escala, baseada na doutrina militar russa, é algo completamente diferente de uma “operação militar especial”. Envolve muito mais recursos humanos e tecnológicos, bem como capacidades de guerra cibernética e espacial. A Rússia acredita que a tolerância dos americanos para com as baixas é reduzida e que a sua confiança na tecnologia é uma vulnerabilidade e, caso necessário, fará a guerra também nas dimensões psicológica e tecnológica.
A 21 de Dezembro, o Ministro da Defesa russo Sergei Shoigu anunciou um plano para reforçar as forças militares russas de 1 para 1,5 milhões de efectivos. A Rússia estará assim a acrescentar meio milhão de recrutas aos 315.000 soldados adicionais anteriormente mobilizados.
Na semana passada, Shoigu enfatizou o objectivo de aumentar as forças navais, aeroespaciais e nucleares, a fim de “garantir a segurança militar do Estado”. Anteriormente, Putin também designou o chefe do estado-maior, Valeriy Gerasimov, para liderar operações de combate na Ucrânia, uma medida eloquente sobre as suas intenções, uma vez que Gerasimov é o autor de uma doutrina de defesa agressiva e declaradamente anti-americana.
Putin, consciente da tradição militar russa e da sua história, está a preparar-se para uma guerra de desgaste a longo prazo. A forma da Rússia ganhar guerras é através do atrito prolongado e implacável de tropas, do clima, do terreno e das diversas contingências decorrentes das especificidades de cada teatro de operações. A capacidade psicológica e logística de tolerar baixas humanas e materiais é fundamental. É como a Rússia tem travado as suas guerras pelo percurso dos séculos: resiliente, paciente, esquiva e preparada para sofrer.
Os russos sacrificaram 25 milhões de vidas na Segunda Guerra Mundial e as suas perdas actuais contam-se na ordem das dezenas de milhar. Dada a população russa de 143 milhões de habitantes, o Kremlin dispõe de recursos humanos para prolongar o conflito e dificultar a manobra de Washington.
A próxima admissão da Suécia e da Finlândia à NATO irá criar um foco de tensão permanente na região. Ao contrário do que tentam vender a administração americana, a Comissão Europeia, muitos dos líderes ocidentais e a imprensa mainstream, esta medida é mais susceptível de desestabilizar ainda a Europa do que de trazer a paz.
A Rússia partilha uma fronteira de 832 milhas com a Finlândia. A aceitação destes dois países na aliança duplicará automaticamente a fronteira entre a NATO e a Rússia, de cerca de 750 milhas para cerca de 1.600, exacerbando as preocupações de segurança do Kremlin.
Os russos partilham acrescidamente um passado turbulento com suecos e finlandeses, que data dos séculos XVII e XVIII, tendo com eles travado múltiplas guerras. Um dos momentos mais marcantes da história da Rússia aconteceu quando Pedro, o Grande, derrotou a Suécia, na altura uma potencia militar europeia, e terminou vitoriosamente a Grande Guerra do Norte, em Julho de 1709, na Batalha de Poltava, que hoje se situa na parte oriental da Ucrânia.
As vidas de milhões de pessoas já foram arruinadas pela guerra, que está sem fim à vista. As perturbações causadas pela migração de refugiados, perda de vidas, insegurança alimentar e escassez de energia irão muito para além da crise imediata, exercendo tensão sobre as economias norte-americanas e europeias.
O Fundo Monetário Internacional alertou num estudo recente que a “fragmentação geo-económica” poderia diminuir o produto interno bruto global até 7% durante um período “a longo prazo” não especificado, invertendo as tendências de integração económica e globalização das últimas décadas.
O FMI previu um maior impacto, 8-12%, nas economias de baixo rendimento e emergentes, atribuindo-o ao conflito Rússia-Ucrânia e à pandemia Covid-19. Muitos países estão fortemente dependentes da Rússia e da Ucrânia para a importação de alimentos, e da Rússia, para a energia. O Banco Mundial publicou recentemente um relatório semelhante, destacando a crise alimentar como a “preocupação mais alarmante”.
Um conflito de natureza regional e de razão histórica, está agora a seguir o caminho de uma guerra sem fim com ramificações internacionais incalculáveis. Tendo investido financeira e emocionalmente nesta batalha existencial, as partes beligerantes não têm estratégias de saída.
E o impacto a longo prazo, na Europa e no mundo, só pode ser medido com referência à castigada história do Velho Continente: não é por essa análise que ficamos mais tranquilos.
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