Março, 1979. Na ressaca de uma digressão super atribulada e altamente polémica, a banda mais subvalorizada de sempre edita a sua ópera magna: “Remote Control”. O quarto trabalho de estúdio dos The Tubes, que até aqui tinham navegado num turbulento proto-punk com notas de glam rock, é uma verdadeira preciosidade. Ao longo dos seus 11 prodigiosos temas dá-se uma sublime convergência entre punk electrónico e pop desalinhado, num embrulho futurista de sintetizadores analógicos e raiva de músicos fora da lei, que anuncia o apocalipse do rock clássico dos anos 70 e introduz o caleidoscópio sensorial que vai acontecer na década que se segue. Praticamente ignorados em Portugal e hoje já esquecidos em todo o lado, os The Tubes sempre foram pioneiros em tudo, uma banda à frente no tempo, desde a conceptualização radical de cada um dos seus discos à produção performativa e disruptora dos espectáculos ao vivo, precursora dos concertos rock contemporâneos.
Produzido pelo mago Todd Rundgren, “Remote Control” é um trabalho inspirado no romance de Jerzy Kosinski, “Being There” (que mais tarde foi transformado num filme protagonizado por Peter Sellers), sobre um falso sábio viciado em televisão. A capa do álbum mostra um bebé num Vidi-Trainer especialmente construído para a produção fotográfica, criado por Michael Cotten e Dave Mellot. A chupeta no monitor, indexando ao vício, é um toque genial.
O tom electrónico de “Remote Control”, implementado por Rundgren, era novo para a banda, até porque era completamente revolucionário na altura. Basta pensar que este disco foi lançado 3 meses antes de “Unknown Pleasures” dos Joy Division, um ano antes dos primeiros trabalhos dos Orchestral Manoeuvres in the Dark e dos Buggles e dois anos antes de “Speak & Spell” dos Depeche Mode e de “Dare”, dos Human League; todos registos iniciáticos do que viria a ser a música electrónica dos anos 80. Antes dos The Tubes, só os Kraftwerk e os Ultravox tinham experimentado os sintetizadores desta maneira reverberante e poderosa.
Grande parte das faixas foram reescritas por Rundgren e pela banda quando em estúdio iniciaram as gravações, incluindo “Turn Me On” (anteriormente “Get Over It”); e “Telecide” (originalmente “The Terrorists of Rock”).
Fee Waybill e Re Styles partilharam a interpretação vocal em “Prime Time”, embora Rundgren tivesse tentado gravar uma versão apenas com Styles. Quando Waybill descobriu, exigiu cantar também, armando uma confusão típica do seu carácter egotista e temperamental. A banda interpretou a canção no Top of the Pops e em digressão na Europa, antes de a excluir da playlist da digressão, para evitar tensões entre Waybill e Styles.
O músico e estilista visual Michael Cotten concebeu um espectáculo multimédia inovador para a digressão do disco, que empregou vários monitores de TV e um projector de filme de 35mm. Testaram-no ao vivo e sem ensaio geral no Royce Hall da UCLA, mas houve múltiplos problemas técnicos, incluindo a fraca visibilidade das pequenas telas de TV, e problemas de sincronização com as projecções do filme. Os custos e as disfunções da parafernália acabaram por levar a uma digressão cenograficamente despojada nos Estados Unidos, Japão e Europa.
“Remote Control”, que hoje se ouve tão bem como no ano paleolítico em que foi lançado, é um disco eterno. Diverso como um banquete, intenso como o diabo, moderno como um manifesto de Álvaro de campos, ecoa para fora do seu tempo, como um sintetizador analógico numa orquestra barroca.
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